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SXSW 2019: Fale com estranhos
O SXSW Pitch é como um painel com 200 pessoas no palco, mas dá pra aprender muito com ele
Uma característica muito confortável do SXSW pra mim é não ter que falar com ninguém. Você entra e sai dos lugares sem pedir licença. Você recebe muita informação sem ter que oferecer muito em troca. Não me entenda mal, Eu sou uma pessoa bem simpática quando falam comigo, mas odeio ter que abordar estranhos e iniciar conversas.
E é por isso que eu NUNCA tinha ido no SXSW Pitch, uma espécie de feira de startups onde várias delas aproveitam a chance de apresentar seus negócios para um painel de profissionais de várias áreas. É de altíssimo nível. As competição são mundiais e muitas das startups já receberam milhões em financiamento. Em geral todas elas já estão ativas, então não é uma competição de ideias.
Hoje foi o dia das finalistas: 50 escolhidas para ficar no salão, cada qual com sua mesinha, distribuindo brindes e explicando seus negócios para quem quiser ver. Não é fácil. Os caras ficam em pé, é barulhento, tem que falar alto. Eles não sabem se estão falando com um curioso, com um repórter ou com um potencial investidor. Então na dúvida eles falam com todo mundo, explicam tudo. É uma ótima lição de persistência.
Eu falei com 3 deles:
A Fantag criou uma plataforma voltada inicialmente para fãs de esportes. Os fãs podem filmar um jogo de vários ângulos e a tecnologia deles sincroniza os videos com horários, selecionando os highlights. O app é funcional e ativo e funciona sem engasgos, é bem impressionante. A única coisa que eu achei fraca foi eles dizerem que o modelo principal de receita é baseado em publicidade, o que eu acho arriscado pelo excesso de concorrência. Mas eles tem outros modelos também.
Eu falei pro Brian Dombrowski, fundador da Fantag, sobre o meu trabalho trazendo empresas para atuar na América Latina e dei algumas sugestões de como atuar com marcas fora do modelo “pre e mid-roll”. Ele foi mega atento, prestou atenção no que eu disse com genuíno interesse. Acho admirável o cara estar nessa luta e ainda ter o tempo e a disposição pra ouvir sugestões de quem vier. Parabéns.
Outro cara que merece nota 10 em engajamento, disposição e paixão pelo próprio produto é o Alex Cohen, do app Twenty Tables. Gritando para superar o barulho, com retórica perfeita e respostas na ponta da língua, ele me explicou o que eles fazem – o que, devo dizer, não é simples.
No aplicativo, restaurantes oferecem refeições pelo preço fixo de seis dólares; eles fizeram uma pequisa e perceberam que o preço de uma marmita carregada pelo trabalhador é esse. Então a ideia é que o usuário pare de levar o almoço de casa e coma nos restaurantes da comunidade, porque o preço é o mesmo. O restaurante enxerga isso como uma oportunidade de marketing. Ele não lucra na operação, mas traz gente pros negócios, que podem comprar mais coisas (bebidas, sobremesa, outros pratos) ou voltar em outra hora.
Eles já estão ativos em Washington DC, com mais de 120 restaurantes de parceiros. O modelo de negócio é complicado: Cohen me falou que ele trabalhou muito tempo na área de saúde, coordenando compras de insumos no atacado em grupo com o objetivo de reduzir custos. A operação do Twenty Tables envolve um serviço de oferecer insumos para os restaurantes a preço mais baixo.
E ele falou tudo isso sem nem saber que eu ia escrever um artigo, sem nem dizer quem eu era. Na verdade a conversa inteira começou porque ele me ofereceu um óculos de sol de brinde. Só no final eu falei pra ele o que eu fazia, mas se eu dissesse que era só um estudante não acho que isso diminuiria o entusiasmo dele. Ele na verdade parecia bem feliz de poder contar tudo que ele construiu (em menos de dois anos). E ah, eles ainda tem um programa de distribuir uma refeição gratuita a cada 20 vendidas. O cara pensou em tudo. Eu realmente espero que esse cara ganhe.
Eu falei ainda também com o Chris Kaye, co-fundador da Sherpa, que criou uma inteligência artificial capaz de realizar avaliações de risco em seguros e com isso oferecer apólices mais baratas. Ele parecia um pouco mais cansado e quis saber o que eu fazia antes de explicar. Eu disse que estava escrevendo um artigo (eu nem ia escrever, só estou fazendo isso pra não mentir pra ele. Se você realmente leu até aqui, agradeça ao Chris).
Passada a não-usual desconfiança inicial ele foi paciente e explicou a montanha que ele está escalando: o público-alvo são profissionais liberais, que em geral não são bem atendidos por empresas de seguros. Por conta disso eles tiveram que criar os próprios produtos, usando as seguradoras como provedoras, e por consequência eles agora são regulados como uma instituição financeira e só atuam no Reino Unido por enquanto.
Foram só três e já deu este artigo gigante (que eu escrevi no bloco de notas do iPhone, o que prova que eu também tenho uma resiliência admirável). E ainda tem mais quarenta e sete pra ver. Eu vou ver ao vivo aqui, mas não vou contar mais nada: você pode conferir as outras empresas aqui.
Mas quero compartilhar esta reflexão aqui: o pitch de celebridades (a Gwyneth Paltrow está nesse momento discursando sobre seus negócios no palco principal) é ensaiado, editado e microfonado. O pitch dos empreendedores é gritado, repetido e interrompidos por perguntas nem sempre camaradas. Dá pra aprender MUITO mais. Estarei sempre aqui falando com estranhos nas próximas edições.