"O Oficial e o Espião" analisa corrupção social da França do século XIX

“O Oficial e o Espião” analisa corrupção social da França do século XIX

Novo filme de Roman Polanski reconta história real de judeu que foi expulso e preso injustamente pelo exército francês

por Matheus Fiore

Roman Polanski sempre foi um cineasta interessado no estudo de processos de degradação. Em muitos casos, essa degradação é na moral do personagem ou da sociedade, como em “Repulsa ao Sexo”, que constrói um mundo de objetificação que por meio do terror gera a repulsa sexual do título. Em outros casos, a mesma degradação moral se torna em dispositivo narrativo para alavancar o drama e expor o ápice da crueldade humana, tal qual o caso do icônico clímax de “Chinatown”.

Às vezes, porém, Polanski parte para estudos mais abrangentes, sobre como estruturas e sociedades adoecidas perpetuam essa degradação. É o caso de “O Pianista”, que acompanha um judeu polonês que tenta sobreviver ao holocausto, e agora deste “O Oficial e o Espião”

Em seu novo filme, o diretor estuda essa degradação na estrutura política, militar e jurídica da França do fim do século XIX, quando o judeu e capitão do exército Alfred Dreyfus (Louis Garrel) foi injustamente acusado de traição e, além de expulso do exército, acabou sentenciado ao isolamento na Ilha do Diabo. A obra acompanha o caso sob a perspectiva de Georges Picquart (Jean Dujardin), outro militar que, incomodado com a rápida conclusão do caso, começa a investigar para descobrir o que está por trás da incriminação de Dreyfus. 

Como em todo bom filme, o interessante não é meramente o conteúdo da obra, mas como seu autor a executa. Em muitos casos, a história de “O Oficial e o Espião” cairia em caminhos um tanto óbvios, que atiram o protagonismo para a vítima da situação e utilizam seu drama como carro-chefe da narrativa.

Já Polanski escolhe uma abordagem diferente, pois a perspectiva de Picquart não só é central à narrativa mas também é a única acessível ao público. É uma escolha que por si só traz vantagens e desvantagens, e o início do filme é um belo retrato disso, na maneira como mostra o momento em que Dreyfus é expulso de vez do exército. Se a cena começa com um plano aberto, distante, no qual mal podemos compreender o que de fato acontece no fundo da imagem, a aproximação vem quando Picquart saca seus binóculos para enxergar, de longe, o rosto de Dreyfus.

Esta estratégia, porém, carrega o ônus de privar o espectador de testemunhar uma parcela de eventos importantes. A família de Dreyfus, por exemplo, só dá as caras na parte final do filme; somos privados de assistir a todo o sofrimento dos familiares do homem injustamente acusado, já que a proposta de Polanski não é construir um drama a partir da situação do personagem de Garrel, mas articular uma investigação pelos engessados sistemas político, militar e jurídico da França do fim do século XIX. 

A perspectiva de Picquart não só é central à narrativa mas também é a única acessível ao público

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Não por acaso, toda a forma do filme acompanha esse engessamento: A montagem atua de maneira repetitiva, por exemplo, pela forma como recorta as cenas e planos com durações semelhantes de forma constante. Toda a articulação visual de “O Oficial e o Espião” segue um formato que pode soar quadrado, mas também existe para acompanhar a rigidez do cenário. Boa parte das cenas é construída na estrutura básica de planos e contra-planos que não abre espaço para muitas inovações visuais, justamente pelo fato do protagonista, Picquart, tentar agir neste mundo intransigente. 

Polanski ainda busca esmiuçar como esse sistema na verdade é tão frágil e ultrapassado, mostrando como sua base não é um ideal de mundo burocrático, mas de problemas morais muito mais humanos e subjetivos como o antissemitismo. Filho de pais judeus que morreram durante a Segunda Guerra Mundial, o diretor retorna ao tema utilizando-o como pano de fundo e potencializador da injustiça imposta ao capitão do exército.

A articulação visual do filme segue um formato que pode soar quadrado, mas que existe para acompanhar a rigidez do cenário

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Entra, então, o bônus da proposta de Polanski. O protagonista, principal responsável por trazer justiça para Dreyfus, é um sujeito de origem totalmente diferente e sem qualquer amizade ou afeto por Dreyfus. Picquart age apenas por seu senso de justiça, por sua ciência de que está operando em um território corrompido – não só estrutural e financeira mas moral, já que a base do plano que condenou o judeu é o antissemitismo. “O Oficial e o Espião”, portanto, torna-se de certa forma em relato sobre a sensação de dever, de obrigação de posicionamento do indivíduo justo perante a injustiça, custe o que custar. 

Tendo em vista a já citada problemática infância de quem perdeu os pais em campos de concentração de Auschwitz e Mauthausen-Gusen, não é difícil imaginar então que Polanski talvez veja este trabalho como uma das mais pessoais. “O Oficial e o Espião” é não apenas um estudo da degradação humana e de um sistema político e social, mas também um aceno para a necessidade de posicionamento diante do que é grotesco e desumano. Mesmo que não fale diretamente sobre o atual momento político da Europa, que vê a ascensão do neofascismo com olhar passivo, Polanski sinaliza que a integridade de figuras como Picquart é necessária em maior escala para que o público observe menos as atitudes e mais as motivações por trás destas.

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