“Breque dos apps”: entregadores fazem greve por melhores condições de trabalho
Reclamações sobre a precarização são inúmeras e se agravaram durante a pandemia de Covid-19 com a falta de equipamentos para higiene e segurança
Há quase um mês, vários entregadores de aplicativos iniciaram protestos com a intenção de denunciar as condições de trabalho impostas pelas empresas de delivery. As reclamações sobre a precarização são inúmeras e se agravaram ainda mais durante a pandemia de Covid-19, uma vez que os colaboradores alegam a falta de fornecimento de equipamentos para higiene e segurança por parte das empresas.
A primeira paralisação nacional engloba entregadores das principais plataformas que atuam no Brasil: iFood, Rappi, Uber Eats, 99Food e Loggi. Entre as pautas levantadas pela greve estão:
- Aumento no valor das corridas;
- Aumento no valor mínimo das entregas;
- Fim dos bloqueios e desligamentos indevidos realizados pelas plataformas;
- Seguro de vida, contra roubo e acidente;
- Ajuda de custo para aquisição de equipamentos de proteção contra a Covid-19.
De acordo com dados de 2019 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil conta com quase 4 milhões de profissionais autônomos que vivem com uma renda gerada por apps de entrega e serviços compartilhados. No entanto, atualmente o número é ainda maior. Só no mês de março, período de início do isolamento social em muitas cidades brasileiras, o iFood recebeu mais de 175 mil novos cadastros de pessoas querendo se tornar entregadores, o que representa mais que o dobro de sua média de inscrições de fevereiro (85 mil).
Além da paralisação, os colaboradores pedem a ajuda dos clientes habituados a utilizar esses serviços, a fim de mostrar que o público também deseja melhores condições de trabalho para eles. A colaboração vem com o boicote dos apps neste dia 01/07, o uso das hashtags #BrequeDosApps e #ApoioBrequeDosAPPs e a avaliação negativa das plataformas em lojas de aplicativo.
Vale ressaltar que embora esta seja a primeira greve realizada por entregadores de apps, outros trabalhadores ligados à chamada Gig Economy, também conhecida como “economia de bicos”, já tentaram organizar greves e movimentos pedindo melhorias nas condições de trabalho, caso dos motoristas de Uber e 99.
As empresas que são alvos dos protestos negam a precarização. Em comunicado enviado ao B9 já na primeira onda de manifestações dos entregadores, iFood e Rappi disseram que durante a pandemia têm disponibilizado medidas de prevenção, cuidados e informação aos colaboradores, adotando os protocolos que seguem as recomendações das autoridades sanitárias.
Quanto aos valores pagos aos entregadores, as empresas dizem que as taxas são calculadas de acordo com diferentes fatores, como distância da rota, cidade e modal. O iFood afirma que no mês de abril “61% dos entregadores recebeu R$ 19,00 ou mais por hora trabalhada (valor que para fins apenas comparativos é quatro vezes maior do que o pago por hora tendo como base o salário mínimo vigente)”. Segundo a empresa, esses 61% de entregadores foram responsáveis por 75% das entregas da plataforma.
Pressão para regulação
A pressão dos colaboradores é o estopim de relações conturbadas entre instituições, órgãos regulatórios, empresas e a própria sociedade, que já estão sendo debatidas há algum tempo. Na busca por um caminho para a retomada do crescimento econômico desde o início da recessão mundial em 2008, novos modelos de trabalho ganharam força, mas são sempre os colaboradores que perdem com essas novas regulamentações – ou a falta delas.
“Certamente, ainda há muito o que se discutir sobre a atuação das empresas do setor de tecnologia no Brasil e no mundo. A pandemia de Covid-19 apenas acelerou esse processo, por conta da adoção em massa de aplicativos que atendem demandas diversas, além de ferramentas de videoconferência e telemedicina”, afirma Franklin Lacerda, Diretor de Estudos da Análise Econômica Consultoria e mestre em Economia Política pela PUC-SP.
Ainda segundo o economista, a paralisação dos entregadores de aplicativos deve acelerar o debate sobre uma revisão nos parâmetros regulatórios das plataformas de delivery, assim como outras empresas tecnológicas.