App oficial do Ministério da Saúde foi programado para só recomendar cloroquina
Funcionamento do app é (mais) uma prova de que o Ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, mentiu ao dizer que o Ministério da Saúde nunca indicou o uso de cloroquina no tratamento da Covid-19
Na última quarta-feira, 14/01, o Ministério da Saúde lançou o aplicativo TrateCov, ferramenta que, em teoria, seria usada para auxiliar médicos no diagnóstico e tratamento de casos de Covid-19. Porém, vários testes realizados na plataforma por programadores, cientistas de dados e jornalistas mostram que o app foi programado para recomendar apenas remédios como cloroquina, hidroxicloroquina, ivermectina, azitromicina e doxiciclina, medicamentos que, por comprovação científica, não possuem qualquer efeito sobre a doença.
Segundo o próprio Ministério da Saúde, o aplicativo funciona de forma simples: basta abrir a plataforma e colocar os dados do paciente – que vão desde idade, peso e sintomas até o quanto a pessoa tem saído de casa nos últimos dias. Em seguida, o app mostra um diagnóstico baseado na pontuação do paciente (score de gravidade), e já indica o chamado “tratamento precoce” com os medicamentos citados.
Pazuello diz que nunca receitou cloroquina e outros medicamentos sabidamente ineficazes contra covid-19. Será mesmo? Então como o sistema oficial do @minsaude receita? pic.twitter.com/mujpADPNEY
— The Intercept Brasil (@TheInterceptBr) January 18, 2021
O jornalista e programador Rodrigo Menegat observou o código-fonte do TrateCov, que está acessível para qualquer pessoa através da URL usando o inspetor de elementos. Segundo Menegat, é bem visível que o código foi programado apenas para receitar o kit Covid: “As únicas funções e objetos visíveis, além de coisas como os cálculos de idade e IMC do paciente, existem para exibir a indicação e posologia das seguintes drogas: ivermectina, cloroquina, hidroxicloroquina, azitromicina, sulfato de zinco, doxiciclina, zinco e dexametasona”.
E, reforço, as únicas drogas que aparecem no código fonte são essas que citei.
— Rodrigo Menegat (@RodrigoMenegat) January 20, 2021
Paulo Boggio, Diretor do Laboratório de Neurociência Cognitiva e Social, também destaca que os remédios são indicados mesmo quando o usuário apresenta apenas alguns sintomas que podem nem ser de Covid-19.
Fiz nova simulação: somente cefaleia e dor nas costas. Resultado: cloroquina e vermifugo. É uma desmoralização monumental da saúde brasileira. Não é possível esse gov e esse ministério continuarem ainda de pé. pic.twitter.com/xXdymvb9nz
— Paulo Boggio (@PauloBoggio) January 20, 2021
A forma como o aplicativo funciona é (mais) uma prova de que o Ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, mentiu ao dizer em coletiva realizada na última segunda-feira, 18/01, que o Ministério da Saúde nunca indicou o uso de cloroquina no tratamento da Covid-19. Pazuello diz que o ministério indica o atendimento precoce e não tratamento precoce: “Temos divulgado desde junho o atendimento precoce. Não confundam atendimento precoce com que remédio tomar. Não coloquem isso errado. Nós incentivamos e orientamos que a pessoa doente procure imediatamente um médico. Que o médico faça o diagnóstico. Esse é o atendimento precoce. Que remédios vai prescrever, isso é foro íntimo do médico com seu paciente. O ministério não tem protocolos com isso, não é missão do ministério definir protocolo”, disse o ministro. No entanto, como visto, o app oficial do Ministério da Saúde tem sim protocolos bem claros quanto ao tratamento precoce.
Vale ressaltar que todos os medicamentos listados no app TrateCov não têm eficácia comprovada contra a Covid-19, e são completamente rejeitados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).