"1984", uma lenda da publicidade
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“1984”, uma lenda da publicidade

por Carlos Merigo

Em Janeiro deste ano, o Macintosh completou 20 anos de vida. Mas por motivos ocultos, o aniversário do computador vai passar praticamente em branco. A Apple orientou todas as suas filiais e a TBWA, agência que a atende, a não comentar a data.

Uma atitude bem conservadora frente a história de sucesso e cheia de polêmicas da empresa, inclusive quando tratamos da publicidade da marca. Aliás, tudo começou assim…

Em 1984, para apresentar o lançamento de seu inovador computador pessoal, o Macintosh, a Apple praticamente parou os Estados Unidos, e consequentemente o mundo. Até hoje, é considerado um dos lançamentos mais célebres da história da publicidade.

Um filme explosivo de 1 minuto criado pela agência Chiat/Day de Los Angeles, hoje incorporada à TBWA, foi exibido no Estádio Houlihan, em Tampa (Flórida, EUA) no intervalo da final do Super Bowl, o campeonato de futebol norte-americano, para as 70 mil pessoas presentes e os cerca de 80 milhões de telespectadores que acompanhavam o jogo pela TV.

Esta, que é aclamada como uma das melhores peças publicitárias de todos os tempos e nem ao menos mostra o produto, custou 1.6 milhão de dólares e foi veiculada apenas uma vez. E como o intervalo do SuperBowl é considerado o minuto mais caro para a publicidade, apenas a veiculação do comercial custou 500 mil dólares.

A produção e direção do filme ficou por conta de Ridley Scott, consagrado por filmes clássicos como Alien (1979) e Blade Runner (1982). O cenário do anúncio é o sombrio mundo descrito por George Orwell no livro 1984, no qual o Grande Irmão (Big Brother) reunia a população mentalmente escravizada para sessões diárias de lavagem cerebral.

Scott realizou o mesmo ambiente escuro no filme, e enquanto pessoas assistem passivas ao discurso do Grande Irmão, no fundo, uma mulher vestindo roupas atléticas que contrastam com a escuridão, corre em direção ao telão com um artelo de arremesso nas mãos.

Os soldados do regime marcham em sua direção para a impedir, enquanto todos no auditório permanecem em seus lugares. Quando a atleta chega diante da tela, efetua o arremesso do martelo cujo impacto provoca a explosão da imagem do ditador.

No final, um locutor encerra dizendo: “Em 24 de Janeiro de 1984, a Apple Computers vai apresentar Macintosh. E vocês verão por que 1984 não vai ser como 1984.”

Não é preciso dizer que a peça causou uma repercussão estrondosa e serviu para muitas conjecturas. A principal delas é que o domínio do Grande Irmão no filme representava o domínio da IBM e a única esperança de ameaçar o reinado seria a Apple.

No livro original escrito em 1948, a inspiração de Orwell era o regime totalitário de Joseph Stalin na então União Soviética. O comercial é elegante e tem uma narrativa cinemática poderosa, contendo insinuações a filmes lendários e mitos culturais.

As referências à IBM vão desde os princípios hierárquicos rígidos até o uso obrigatório de uniformes dentro da empresa na ocasião. Nesse contexto, a tela onde fala o Grande Irmão se assemelha a um monitor de computador, e códigos de informática podem ser claramente identificados.

O desenho na camiseta da atleta é uma maçã, logotipo da Apple, e um monitor com teclado estilizados. A mulher destoa do resto do ambiente, mostrando que o Macintosh traz cor e vida para o mundo da computação, prazer estético e lazer, ao contrário do azulado e frio da IBM até então.

Também fica clara a relação do orgânico contra o inorgânico, afim de demonstrar a proposta da Apple de criar uma máquina como se fosse um ‘ser vivo’. O design mais gestual acentua essa característica, que continua vigente até hoje, vide os iMac’s

No livro de Orwell, a classe trabalhadora era formada apenas por homens brancos. No comercial, a mulher representa uma quebra deste paradigma, além de ser uma figura políticamente igual, é atenta aos poderes repressivos do capitalismo e usa táticas revolucionárias em resposta.

Por ser uma atleta, demonstra o treinamento rigoroso de seu corpo, um protesto contra os corpos dóceis e sujeitos as massas robotizadas. Aliás, vemos as pessoas mostradas estritamente como máquinas trabalhadoras, controladas por computadores.

Como se vê, o comercial carrega diversos manifestos contra uma série de fatos, incluindo o capitalismo, a repressão e desigualdade sexual, racial e ecônomica. Não é a toa que se tornou tão célebre e cultuado. Intitulado logicamente de “1984”, o filme ganhou diversos prêmios, incluindo o Grand Prix no Festival de Cannes.

Você pode fazer o download dos comercial na versão pequena, com 3.13 MB, ou na versão maior e recomendada, com 13.1 MB, ambas em formato .mov. Se preferir, clique aqui para assisti-lo diretamente do site da Apple.

Existe ainda um Making Of com cenas dos bastidores da filmagem. Clique aqui para baixar o arquivo em formato .mov, são 4.50 MB.

Assista o filme e não se esqueça de comentar esta que é uma das peças mais famosas da publicidade mundial

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