“LEGO Batman” é uma alternativa bem-humorada aos filmes do herói

“LEGO Batman” é uma alternativa bem-humorada aos filmes do herói

Animação mantém o ritmo frenético de “Uma Aventura Lego” e faz sátira do universo Batman nos cinemas

por Virgílio Souza

Embora seja oficialmente um spin-off de “Uma Aventura Lego”, “LEGO Batman” é uma história muito mais centrada no herói do que na linha de brinquedos que, três anos atrás, deu origem a essa nova franquia. Para além do título e das aparências, o filme se sustenta principalmente no universo do vigilante de Gotham City, tanto nos quadrinhos quanto em suas adaptações para o cinema.

O longa de Chris McKay, que herda a direção da dupla Phil Lord e Christopher Miller, investe boa parte de suas fichas na relação do personagem com o próprio legado cinematográfico. Desde a estreia no meio, em 1966, os filmes do morcego seguem um caminho marcante na indústria. Ao mesmo tempo em que ocupam a vanguarda do que hoje se trata como um gênero, ditando tendências seguidas por outras aventuras de super-heróis, sabem também se posicionar diante de reações negativas e influências externas, mesmo que acertem e errem com frequência semelhante.

Mudanças de tom fazem parte dessa trajetória, e para vê-las basta colocar lado a lado as interpretações de Adam West e Val Kilmer, Michael Keaton e Ben Affleck, George Clooney e Christian Bale. Leveza e seriedade se alternam, entram e saem de moda de tempos em tempos, e momentos de reinvenção são cruciais nesse processo. O que parece inédito na série, particular desse episódio estrelado por Will Arnett, é a maneira de encarar os sucessos e fracassos anteriores.

O diretor Chris McKay (centro) com os dubladores Will Arnett e Zach Galifianakis

“LEGO Batman” não se apresenta exatamente como uma reação ao clima sóbrio que tem reinado na franquia em tempos recentes, seja pela via do realismo da trilogia de Christopher Nolan ou pela atmosfera carregada de Zack Snyder. De maneira muito oportuna, a animação é construída como uma alternativa bem-humorada a esses filmes, e se aproveita das possibilidades do formato para explorar o universo do herói. A sensação não é de rompimento com o cânone ou de desconstrução de fórmulas já conhecidas, mas de que Bruce Wayne pode finalmente refletir sobre as experiências dolorosas que enfrentou ao longo de mais de cinco décadas de combate ao crime — e que essa reflexão pode ser feita como uma comédia direta e alucinada.

A escalação do elenco já adianta a proposta. No expressivo currículo de Arnett, um crédito se destaca: é ele quem dá voz ao anti-herói do seriado “Bojack Horseman”, outro sujeito solitário em crise visto pela lente do humor. O ator se junta a Zach Galifianakis, que interpreta o Coringa, e ao colega veterano de “Arrested Development”, Michael Cera, que faz o papel de Robin. Completando o grupo central, o Alfred de Ralph Fiennes e a Barbara Gordon de Rosario Dawson servem para assegurar duas coisas: que a trama principal de herói contra vilão siga adiante e que o subtexto sobre família e solidão não se perca no caminho.

Em um sentido mais amplo, a ideia é observar tudo o que existe no entorno do Batman, encarar de frente suas características mais diversas e fazer rir a partir da confirmação ou subversão de cada uma delas. A voz grave do protagonista pode ser parecida com o que se espera dela, mas as coisas mudam de figura quando a escutamos improvisar rimas e beatbox no meio de uma frase qualquer.

O fato de a composição dos personagens se sustentar principalmente em suas vozes dá aos roteiristas e ao diretor maior liberdade de ação. Saem figuras de carne e osso, entram pequenas peças coloridas. Nesse sentido, “LEGO Batman” se aproveita também de um estilo pré-aprovado pela audiência nos videogames (“LEGO Star Wars” e demais jogos licenciados têm público cativo há anos em várias plataformas) e nos cinemas (a aventura anterior foi a quinta maior arrecadação nas bilheterias americanas em 2014).

Favorecem esse ritmo frenético tanto as dinâmicas de movimentação dos personagens, que saltam pelos espaços como se simulassem animação em stop-motion, quanto a própria lógica do produto original, sobretudo pela possibilidade inesgotável de construir e reconstruir cenários e objetos. Consciente de que está diante de uma mitologia enorme construída pela DC Comics, o roteiro (escrito por cinco autores e comandado por Seth Grahame-Smith) aproveita o embalo para enfileirar aparições de vilões, bordões, músicas-tema e referências visuais sem que houvesse amanhã — listas de easter eggs devem povoar a internet nas próximas semanas. Essa agilidade é o que torna o filme ao mesmo tempo tão funcional e um tanto cansativo.

Unindo a funcionalidade de um componente à popularidade do outro, “LEGO Batman” é feito sob medida para fisgar o jovem espectador atual

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O bombardeio de informações na tela impede que o tédio tome conta da trama (bastante simples, quando se pensa nela), mas o volume das piadas nem sempre é indicativo de sucesso, e algumas delas passam sem que haja muito tempo para reação. Ainda assim, é difícil negar que “LEGO Batman” diverte em grande parte da maneira mais óbvia, unindo a funcionalidade de um componente à popularidade do outro dentro de um pacote feito sob medida para fisgar o jovem espectador atual — ávido por artigos colecionáveis, dedicado aos personagens que cultua e ansioso para embarcar na ação.

Por mais que tudo se sustente em referências e falte espaço para decisões mais originais, deve-se reconhecer que McKay sabe recriar imagens conhecidas de maneira inventiva. É realmente impressionante o modo como o diretor enche de vida e altera completamente o impacto de sequências tradicionais dos quadrinhos, como aquela na sala dos espelhos ou no túnel do amor, mesmo que cada uma delas dure somente alguns segundos e sirva para contar apenas uma piada. Se com um punhado de LEGO é possível construir milhares de combinações diferentes, essa (sem cinismo nem pose, mas cheia de entusiasmo) talvez seja uma das mais satisfatórias diante das regras impostas e das peças à disposição.

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