VFX Rio revela segredos por trás dos efeitos visuais das grandes produções de 2017 na CCXP
Mini-edição do evento na CCXP dissecou trabalho por trás de personagens dos novos “Blade Runner” e “Planeta dos Macacos”
Com a exceção da apresentação inaugural dos estúdios de cinema (que este ano ficou à cargo da Universal), a quinta-feira da Comic Con Experience no auditório Cinemark geralmente é reservada a painéis mais mornos e voltados a tipos muito específicos de público. Nesta quarta edição isto não foi diferente: O principal salão da feira teve neste primeiro dia painéis voltados principalmente aos quadrinhos e subcelebridades, com as mesas centradas na Marvel Comics e o Batman atraindo interesse médio do público que fazia passagem pelo lugar e as conversas com os jovens atores Robbie Kay e Dean Charles-Chapman gerando alguns olhares atentos dos fãs de “Once Upon a Time” e “Game of Thrones” – ainda que o último tenha soado como um tapa-buraco mal ajambrado feito em razão do cancelamento em cima da hora do ator Nikolaj Coster-Waldau, semi-protagonista da grande produção televisiva da HBO.
Entre estes eventos voltados a públicos muito específicos e a grande atração da noite, porém, o espaço de tempo foi preenchido com duas apresentações no mínimo intrigantes da VFX Rio, feira de efeitos visuais que acontece no Rio de Janeiro neste fim de semana e que cedeu à colega nerd dois convidados de grandes empresas do ramo. Foi um momento curioso do dia pois, ainda que o material exibido na gigantesca tela do auditório Cinemark não fizesse exatamente o perfil da CCXP, ela foi suficiente para prender o público presente a ponto de despertar palmas vibrantes ao final de cada uma das duas rodadas.
Recriando androides
ATENÇÃO: Spoilers de “Blade Runner 2049” nos parágrafos abaixo!
A primeira empresa a subir no palco foi a MPC, estúdio responsável entre outros por alguns dos efeitos de “Blade Runner 2049”. Comandada pelo supervisor de efeitos visuais Richard Clegg, que assumiu o painel pontualmente às seis da tarde, o painel foi dedicado ao processo de recriação da personagem Rachael, replicante do longa original que faz uma ponta surpresa na continuação dirigida por Denis Villeneuve com a mesma aparência vista no filme de 1982. Segundo Clegg, a “ressurreição” da personagem encontrou maiores dificuldades por conta desta maior passagem de tempo: além da resolução da imagem do longa de Ridley Scott ter se tornado obsoleta frente ao avanço tecnológico e o advento do 4K, a equipe da MPC também teve que recriar por completo a performance da atriz Sean Young no computador, replicando tanto sua movimentação quanto gestos faciais. A preocupação central era a de evitar o “uncanny valley”, termo técnico usado para definir aquela sensação de estranhamento que o público tem quando uma figura humana gerada por meios digitais soa “humana demais” aos seus olhos.
Posto o desafio, o grupo responsável pelo trabalho dividiu o processo em quatro partes. Na primeira, foi feito um estudo de referência amplo sobre a personagem e a atriz, buscando capturar o maior número de posições e frames possíveis do filme com Rachel e do rosto atual de Young à partir de dados de textura, geometria do rosto e atuação facial em altíssima resolução; com estes estudos, construiu-se um modelo baseado na atriz e uma modelo de feições muito parecidas, esculpindo a cabeça com base nas referências visuais da época – Clegg afirma que existem mais de 125 milhões de polígonos no rosto e meio milhão de fios de cabelo na cabeça do produto final, um nível de detalhe bastante impressionante.
Com o modelo pronto e as texturas finalizadas, a meta final era fazê-lo se mover com naturalidade e fazer a cena. Segundo Clegg, a equipe teve que recriar a cena digitalmente para inserir o personagem, escaneando a laser o set esvaziado e usando sondas de luz para refazer a iluminação usada na cena. A renderização chegou a ser de 20 horas por frame, mas a MPC arranjou um jeito da finalização não tomar 40 dias do trabalho.
Macacos na neve
Finalizada a apresentação da MPC, foi a vez da toda poderosa Weta Digital subir no palco do auditório. O também supervisor de efeitos visuais Dan Lemmon recebeu o público da convenção para falar um pouco do processo criativo que levou à animação dos macacos de “Planeta dos Macacos: A Guerra”, cujo trabalho de efeitos visuais já desponta como um dos grandes favoritos do Oscar 2018 – a Fox inclusive buscar desafiar os preceitos da Academia impulsionando uma campanha para a indicação de Andy Serkis à categoria de Melhor Ator, mesmo ele tendo trabalhado a todo instante com performance capture.
É sobre aprimorar o performance capture, inclusive, que a apresentação de Lemmon se tratou. Segundo o supervisor, a dificuldade maior de trabalhar a tecnologia ao longo da nova trilogia foi encontrar uma maneira de captar as performances dos atores nos macacões em ambientes não controlados, dominados por eventos meteorológicos como chuva e neve, e reorganizar o movimento humano dentro do modelo símio do computador, em um processo de rearranjo denominado tecnicamente de retargeting.
Resolver o primeiro problema era consideravelmente fácil – segundo o supervisor, foi implantado uma “mochilinha” nas costas dos atores que intensificava a emissão dos pontos infravermelhos para a câmera – mas o segundo envolvia um maior apuro. Com a colaboração do zoológico de Wellington, a Weta fez um estudo de referência de diferentes espécies de macacos e com imagens de ressonâncias magnéticas recriou estruturas ósseas, musculares e de peles dos animais no computador. À partir disso, foram esculpidos modelos muito básicos, cujas especificidades foram sendo retocadas ao longo da produção – algo repetido com ainda maior dedicação nos rostos, que até o último momento foram sendo esculpidos.
Outro trabalho difícil executado pela equipe de efeitos visuais do filme foi a questão de partículas em pêlos. Lemmon contou no painel que foram criados padrões crescentes de pêlos molhados e sujos de neve para materializar os personagens símios em cenas passadas nestes ambientes, que neste terceiro capítulo se multiplicam exponencialmente em relação aos outros dois filmes. Nas cenas de luta, vale dizer, foram criados simulações inteiras para entender o comportamento da neve nos personagens, afim de obter o máximo de realismo possível.
O B9 há alguns meses já tinha entrevistado Serkis sobre o processo de criação dos efeitos visuais do terceiro “Planeta dos Macacos” – confira abaixo: