Como a Paramount pretende mudar o cinema pela tecnologia com “Projeto Gemini”
Além de Will Smith jovem e recriado com CGI, filme dirigido por Ang Lee marca aposta do estúdio em novo formato de 3D que promete imagens ainda mais nítidas
Faz quase sete anos que a Warner Bros. lançou nos cinemas “O Hobbit: Uma Jornada Inesperada”, filme que não apenas trouxe para as telonas o universo elaborado por J.R.R. Tolkien como também abriu os trabalhos de uma “trilogia prelúdio” para “O Senhor dos Anéis”. Para além da comoção cultural pelo retorno de uma franquia tão consagrada, porém, a estreia do prequel dirigido por Peter Jackson também marcou época por ter se firmado como primeira grande incursão dos estúdios de Hollywood por uma tecnologia que mexe diretamente em um dos mecanismos fundamentais da sétima arte: o HFR.
Sigla em inglês para “high frame rate”, o HFR na verdade se refere a um aumento na taxa de quadros exibidos por segundo, cujo sequenciamento é responsável por possibilitar o movimento das imagens mostradas em vídeo. No audiovisual, enquanto convencionou-se o uso da velocidade de 24 quadros por segundo (ou 24 fps) desde a época dos primeiros experimentos com o cinema, é possível desde sempre filmar sob as taxas de algo da altura dos 48 quadros por segundos (48 fps), permitindo que se crie uma imagem de movimentos mais fluidos e dotada de maior nitidez – ainda que a sensação aos olhos do espectador habituado com o modelo tradicional seja de um vídeo “acelerado” e muito parecido com o visual de novelas.
Foi exatamente a definição de 48 fps que Peter Jackson escolheu para filmar todos os três capítulos de “O Hobbit” no começo dos anos 10, afim de proporcionar uma experiência ainda mais imersiva para a adaptação da jornada de Bilbo Baggins para derrotar o dragão Smaug junto da companhia de Thorin Escudo-de-Carvalho. Mas embora a Warner Bros. tenha chegado a bancar a proposta do cineasta, a ideia de exibir os filmes nesta velocidade de “alta definição” acabou morrendo na praia perante as redes de exibição: temerosas de um possível prejuízo nas vendas de ingresso, as principais cadeias de cinema dos Estados Unidos e ao redor do globo tornaram a projeção em HFR uma espécie de “edição limitada” do lançamento, restringindo-o a poucas salas dentro do plano de debute do estúdio.
E se com um lançamento que buscava uma exibição em 48 fps as grandes redes de cinema já consideravam uma “jogada arriscada”, o que pensar de um filme como “Projeto Gemini”, que a Paramount Pictures planeja lançar em salas ao redor do mundo com cópias na velocidade 120 quadros por segundo?
Entra Gemini
“Projeto Gemini” no caso é o novo filme de ação de Ang Lee, diretor taiwanês bastante conhecido do grande público por trabalhos como “O Tigre e o Dragão”, “Brokeback Mountain” e “As Aventuras de Pi”, mas o grande chamariz da divulgação, porém, é mesmo Will Smith, que ocupa um papel duplo inesperado na produção. Além de dar vida a um matador de aluguel aposentado, o ator também é base para um clone do protagonista, que passa a caçá-lo a mando de seu antigo trabalho e cuja juventude é fruto de todo um trabalho da equipe de efeitos visuais a partir de técnicas de captura de movimento e CGI – indo contra a “moda” atual da tecnologia de rejuvenescimento digital que se tornou base para longas como, por exemplo, o vindouro “O Irlandês”, de Martin Scorsese.
Mas ainda que a premissa já seja em si um grande desafio, o personagem humano de computação digital parece um obstáculo menor perto das escolhas de formato que Lee, o produtor Jerry Bruckheimer e a Paramount tomaram para filmar o projeto. Não bastando o HDR em 120 fps, toda a fotografia de “Gemini” foi feita em cima de uma técnica que o estúdio vem promovendo como “3D Plus”, uma “evolução” do 3D atual que aumentaria a sensação de profundidade dos planos e permitiria aos realizadores obter uma variedade mais ampla de texturas.
Se esta conjuntura tende a levar alguns a temer por uma sessão atrapalhada por desconfortos com a formatação da imagem, a boa notícia é que o resultado final flui com naturalidade. Em evento realizado em São Paulo para a imprensa e redes exibidoras, a Paramount Brasil exibiu três cenas isoladas no combo do HDR 3D que mostraram o quanto a tecnologia é confortável de se adaptar no andamento das cenas. Apesar de ser claramente bem mais nítida (as imagens são registradas de forma acelerada), a velocidade de 120 fps é tão distinta dos habituais 24 quadros por segundo que a visão se ajusta tão logo as sequências começam.
Para Lee, o HDR 3D soa ideal para se fazer o registro da ação, dado que a clareza da fotografia o permite mostrar movimentos de maior complexidade sem que estes passem batido ao espectador – em determinado momento de uma briga entre os dois personagens interpretados por Smith, por exemplo, o filme nem precisa recorrer a um plano detalhe para fazer o registro do uso de um osso pelo clone para ferir as costas do humano.
Mais interessante, porém, é que pelo menos durante os 25 minutos mostrados o diretor parece se divertir bastante com a nitidez alta para testar todo tipo de textura na narrativa, desde caveiras pútridas em cataratas até espelhos que se tornam rebatedores de granadas, passando por uma sequência de visão termal que lembra bastante os gameplays de jogos de tiro em primeira pessoa.
Distribuição, desafios e apostas
Toda esta proposta soa linda no papel, mas a verdade é que sem a distribuição devida esta versão de alta definição de “Projeto Gemini” passe batida pelo público. Esta narrativa é conhecida de Lee, vale dizer: seu longa anterior, “A Longa Caminhada de Billy Lynn”, também foi filmado em HDR na velocidade 48 fps e viu sua trajetória nos cinemas implodir no meio do caminho após uma péssima bilheteria nos Estados Unidos, o que levou a Sony Pictures na época a lançar a produção direto em home video em diversos mercados – incluindo o Brasil.
Mas assim como nos Estados Unidos, a Paramount no Brasil pelo visto pretende fazer uma grande aposta no formato, a ponto de bancar que todas as exibições em 3D do longa no país sejam no modelo de HDR. Ao B9, representantes do estúdio confirmaram que as negociações com as redes de salas de cinema serão feitas de forma que o filme seja exibido apenas em 2D com a taxa de quadros normal ou em HDR 3D – em outras palavras, as cópias em 3D da produção que passarão nas telas do país serão somente no formato de maior taxa de quadros. Estas negociações envolvem, claro, um “mapeamento” das salas 3D que permitirão aos representantes da Paramount no país definir junto das exibidoras as salas que abarcam e não abarcam o formato sem maiores prejuízos.
Quanto ao público, a Paramount também confirmou ao B9 que a estratégia de divulgação de “Gemini” passará pelo esforço de estimular os espectadores a assistir o filme na sua versão HDR 3D: “A gente vai encorajar que as pessoas tenham esta experiência diferente, o filme foi feito para isso”, declara um representante da Paramount. “Temos certeza que esta tecnologia será usada por outros filmes, é uma evolução que não passa apenas pelo 3D. A tendência do cinema é aprimorar a experiência do espectador sempre”, conclui,
Com HDR 3D ou não, “Projeto Gemini” chega aos cinemas brasileiros no próximo dia 10 de outubro.