Primeiro episódio de "Falcão e o Soldado Invernal" reforça sensação de folhetim do Marvel Studios

Primeiro episódio de “Falcão e o Soldado Invernal” reforça sensação de folhetim do Marvel Studios

Foco do piloto em dramas cotidianos busca dar conta de premissa interessante em torno do lado humano da vida dos heróis

por Pedro Strazza

É pelo menos desde “Guerra Civil” que se repete a piada de que o universo do Marvel Studios virou uma espécie de grande novela contada por meio de seus filmes, mas o paralelo nunca ressoou de maneira tão verdadeira quanto no primeiro episódio de “Falcão e o Soldado Invernal”. Isso porque, pelo menos na reta inicial, a segunda série do estúdio no Disney+ é o primeiro produto do estúdio a ter na forma um elemento que se tornou recorrente no andamento dos folhetins mais populares: a sensação de cotidiano, do que é corriqueiro ao mundo daqueles personagens.

Não que outros projetos do dito MCU já não tenham surgido com a mesma característica (“De Volta ao Lar” logo surge à cabeça), mas enquanto nestes tal sensação pertencia primeiro à premissa, o seriado focado em Sam Wilson (Anthony Mackie) e Bucky Barnes (Sebastian Stan) dá todos os sinais de que enxerga na rotina parte do seu modo de operação. A estrutura epopeica de certa forma continua e aos poucos deve crescer para dar norte à história, mas o que parece interessar ao showrunner Malcolm Spellman e à diretora Kari Skogland em um primeiro momento é a noção do entreato: saem os super-heróis, entram os humanos.

Para os padrões da Marvel e mesmo com todo o investimento financeiro, afinal, o drama a princípio não poderia ser mais ordinário: enquanto o Falcão alterna a vida militar e o recebimento do “manto” do Capitão América com a busca pela reconexão com a irmã (Adepero Oduye), o Soldado Invernal continua a lidar com os traumas do passado armamentício dentro da esfera das pequenas ações, tentando retomar uma vida normal na medida do possível. Quando a psicóloga vivida por Amy Aquino diz a Bucky que ele agora é um civil, a mensagem parece direcionada também ao espectador.

Kari Skogland (ao centro) conversa com Anthony Mackie e Adepero Oduye no set

Embora não o exima das falhas, esta proposta explica em parte o porquê do piloto soar tão banal em tudo que se registra. O argumento de que a série prepara terreno para os próximos cinco capítulos neste ponto pode ser válido (ainda mais porque os protagonistas nem se encontram e o vilão Zemo não dá as caras), mas mesmo a ameaça da vez soa de pronto como um apêndice dos eventos do plano geral do estúdio. O antagonismo pode ser dos Apátridas, um grupo de pessoas que acredita na teoria do vilão Thanos de que menos pessoas tornam o mundo melhor, mas será o dilema dos personagens que move a história ao espelhar o fim da trajetória do Capitão América e a dificuldade de aceitar o tal “novo mundo” proferido pelo Máquina de Combate (Don Cheadle).

A direção de Skogland não mente, porém, que o maior interesse da produção está nos pequenos atos, o que é curioso dado que o episódio inaugural começa a desandar a partir daí. Mesmo sendo o primeiro projeto do Marvel Studios a jogar qualquer luz no cotidiano de seus personagens super-heróicos, a reta inicial de “Falcão e o Soldado Invernal” projeta uma sensação de redundância sobre os eventos, como se nada ali estivesse muito fora do que já é esperado pelo público.

O melhor momento, isolado, é o da reunião de Wilson e sua irmã com o banco, pois ele aproveita uma incongruência da narrativa (afinal, heróis são remunerados?) para mover o humor e o drama daqueles personagens. O restante dos 40 minutos orbita entre o aborrecimento e uma lógica de continuidade dos eventos que não necessariamente requerem um convencimento do espectador para se seguir.

Mesmo a ameaça da vez soa de pronto como um apêndice dos eventos do plano geral do estúdio

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Essa execução já parte de uma posição de decepção não apenas porque dá sinais de que a ação (em tese o grande chamariz da série) repetirá os resultados pífios e burocráticos de “WandaVision” – e neste ponto é difícil não apontar a peculiaridade do cenário de avião em queda da abertura ser evaporado sem qualquer resolução – mas porque é neste início que a produção tem mais espaço para brincar com a “vida real” dos protagonistas. Sinal disso é o encontro de Bucky no piloto: não basta apenas a situação de ver um super-herói flertando, é necessário envolvê-lo em alguma trama relacionada aos parentes de suas vítimas para deixar claro o trauma em movimento.

Discrição nunca chegou a ser algo presente nas narrativas dos filmes e séries do Marvel Studios, é sempre válido apontar – a essa altura, meio que já se espera uma falta de sutileza no trato daquilo que de fato importa às produções e ao “grande cenário”. Mas enquanto sua honestidade na premissa e na forma podem ser encarados como valores por alguns e a narrativa há de perseguir uma escala maior para justificar as tantas promessas de conexão com mais eventos do MCU, “Falcão e o Soldado Invernal” começa com a sensação ruim de dever um motivo para existir fora do fluxo da narrativa “maior”. E se uma boa novela é aquela que sobrevive a ciclos de audiência e “pulos” de episódios e histórias, a série por enquanto arrisca ser um capítulo redundante na longa trama tecida por seu estúdio.

O primeiro episódio de “Falcão e o Soldado Invernal” está disponível no Disney+.

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