Transcrição Mamilos 10 – A boa morte, rombo na Petrobrás, realitys bizarros e seca
Jornalismo de peito aberto
Essa transcrição é um presente da Lu Machado para todos os mamileiros. <3
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Cris: Mamileiros, Mamiletes mais aqui uma vez essa semana Mamilos #10 muita conversa pra colocar na mesa.
Ju: E trouxemos convidadas ilustríssimas.
Cris: Gente do céu! Cês não tão entendendo! Eu troquei de roupa, fiz chapinha no cabelo porque essa mesa aqui, o negócio tá quente, ou tá fria… não sei.
Ju: Mamilos endurecidos para receber Jussara Almeida.
Cris: Intumescidos! (risos)
Ju: Jussara Almeida pesquisadora da relação do homem contemporâneo com a sua finitude, terror e negação da morte e a relação da religião com tudo isso.
Ju: Oi Jussara!
Jussara: Oi tudo bem gente! (risos) Deu até um calafrio aqui… (risos)
Ju: Gente eu não tenho Q.I. nem pra falar o que ela já fez quanto mais pra conversar. Vamos lá! Continuando na mesa temos Camila Appel, dramaturga, blogueira de Folha de SP autora do blog Morte sem Tabu
Camila: Olá!
Ju: E também com a doutora Milena: Reis, medica clinica geral com atuação em cuidados paliativos no Instituto do câncer do estado de SP.
Milena:: Oi gente boa noite!
Cris: Eu não falei? Eu não falei Juliana? Essas produtoras executivas que estamos nos tornando… preste atenção nesta mesa… depois nós vamos tirar uma foto dessa mesa.
Ju: Vamos! Mas primeiro cabe o agradecimento porque a gente só conseguiu essas pessoas incríveis aqui graças a ajuda do ouvinte…
Cris: do Lourenzo cabeção que trabalha comigo que é adorável e que me apresentou a Camila que foi uma querida e começou a contar um monte de nomes legais incluindo o da Jussara
Ju: do André Lopes Ventura que é medico e escuta o nosso programa e nos ajudou a chegar até a doutora Milena: e acho que quem indicou Jussara na verdade foi a Camila, mas a gente pediu ajuda pro Ivan também que se ela não aceitasse ele fizesse uma pressãozinha (risos). Porque na verdade o ouvinte não sabe, mas vai rolar um crossover do Mamilos com o Anticast.
Cris: É quase um crossdresser (risos) porque a gente foi conversar sobre identidade de gênero no Anticast e falamos muita besteira lá. O Ivan nunca mais vai chamar a gente.
Ju: Muito! Vamos lá escutar que… Nos prestigiem pra parecer que é bacana! Então é isso gente. Vamos começar com a pauta que a pauta tá longa.
Cris: E vamos começar com o nosso fala que eu te escuto. Conta aí Ju o que que aconteceu
essa semana
Ju: primeiro eu tenho que começar nos retratando de uma canelada, de uma bola fora, de uma errata é… Sobre o comentário que a gente fez no Trending Topics da semana passada da riqueza de 1% ter ultrapassar os 99%. Não é beeem assim né a gente recebeu alguns links muito legais a gente vai colocar no post, eu já compartilhei no Twitter, gente sigam o Twitter porque a gente expande as discussões que são feitas no programa através do Twitter e eu vou botar um quote aqui “pra enxergar o problema aqui vai outra versão do mesmo número a riqueza combinado dos meus dois sobrinhos já é maior do que a dos 30% mais pobres do mundo somado e eles não têm nem emprego ainda ou heranças, eles tem apenas um porquinho para guardar moedas e nenhuma dívida”. Então o que está sendo questionado é o índice que foi usado o método de cálculo metodologia de cálculo usada pra chegar nesse número que possibilitou essa afirmação. É, assim de qualquer maneira inquestionável que é desigualdade é muito alto qualquer medição razoável mostra que esse 1% tem no mínimo 40% da riqueza Global então essa discussão é boa. Eu to um tempão querendo ler o Capital do Século 21 do Piketty, quando eu conseguir eu conto pra vocês. Além disso, a gente queria aqui, várias pessoas falaram que não foi muito justo a gente ter gravado com Paulo e depois colocado o depoimento dele numa mesa em que ninguém concordava com ele para debater. A gente tem uma série de limitações e dentro dessas limitações a gente procura sempre ser o mais rico possível na composição da mesa, mas pra tentar dar uma corrigida nisso ele fez um e-mail, nos mandou um e-mail com as considerações dele depois de ter escutado programa é aqui vai pra você não na íntegra mas nos pontos mais importantes, segundo o data Juliana RISOS “Os Números que citaram das falhas de pena de morte sim são verdadeiros mas em todos os casos se levaram até 30 anos pra fazer os julgamentos”, lembrando que ele sempre falou que pra funcionar tinha que ser julgamento meio rito sumário. Sobre o desarmamento “os números do Sou da Paz e Vida Rio são números claramente falsos em especial colocando lado a lado de outras pesquisas todas as cidades americanas que têm mais armas têm menos crimes, Interpol acabou de chegar a conclusão que o desarmamento não deu resultado nenhum país, o Viva Rio contabilizou como briga entre vizinhos guerra de traficantes ou seja mau uso dos números pra atender o impulso dado pelo governo que paga à essas ONGs uma fortuna. O impulso que existe entre uma pessoa puxar arma erradamente diminui se ela sabe que o outro também pode estar armado não existe nenhum tipo de equilíbrio de forças, os marginais andam armados com tranquilidade porque sabem que é impossível cidadão reagir”
Cris: é isso aí mas alguns pontos que o Paulo colocou aqui pra gente conversar e o nosso já consultor jurídico Marcelo Bezerra mais uma vez trouxe um ponto de vista super legal pra gente colocar aqui “no que diz respeito à possibilidade de psicopatas estarem livres nas ruas cometendo mais crimes é certo afirmar que as leis brasileiras são muito brandas com assassinos dolosos porém cabe fazer uma diferença entre pena sendo essa punição tem caráter punitivo e medida de segurança que é o que tem caráter preventivo. No Brasil o tempo máximo de cadeia é de 30 anos e isso corresponde a uma pena, para o psicopata essa regra não se aplica o psicopata condenado será submetido também a uma medida de segurança e não há uma lei de tempo máximo para enclusuramento desse indivíduo que se mostra incapaz de viver em sociedade”. Então pra mim é uma informação nova isso…
Ju: eu também nunca tinha ouvido falar nisso.
Cris: mais uma vez contribuindo aí pra gente ter um entendimento mais integral do tema.
Ju: e como sempre a participação de vocês é incrível e mails incríveis, comentários incríveis todo mundo inteligente todo mundo gentil – mamilos melhores ouvintes do mundo!
Cris: e a gente chegou eu estavamos conversando sobre essa semana a gente recebeu muito e-mail e a gente adora receber os e-mails mas é que vem muita coisa interessante que seria muito legal se fosse comentada no site porque teria oportunidade de outros ouvintes também lerem e debaterem sobre esse ponto de vista. Mande e-mail, mas comentem no site, enriquece a discussão né Ju?
Ju: é exatamente… Eu até… vocês por mandarem coisas tão legais até me fizeram cogitar abrir um Facebook só pra compartilhar essas coisas…
Ju e Cris em coro : nãããããão
Ju: mas foi aquela coisa né deu a vontade e passou!
Cris: isso! É só ficar quietinha…
Ju: gente muita coisa pra falar vamos para o trending topics.
Cris: Nos vamos falar uma Novidade essa semana no Trending Topics é verdade?
Ju: é uma coisa que ninguém nunca pensou…
Cris: é sobre a falta de água?
Ju: ééé
Cris: olha… Por que que a gente tá falando tanto nisso hein?
Ju: porque não resolveu e não há Horizonte de resolver
Cris: ai ai ai é a triste realidade.
Ju: então gente só pra #ficadica a gente leu um texto sensacional chamado Ensaio Sobre a Cegueira hídrica e ele mostra exatamente a diferença entre faltar água na sua casa no seu bairro e faltar água na cidade a gente tá todo mundo preocupado aqui como vai lavar o cabelo como vai lavar roupa como que vai cozinhar ninguém tá pensando na questão na dimensão social de faltar água na cidade inteira é uma boa reflexão
Cris: o texto é bem interessante a gente vai linkar aqui pra todo mundo ler é um texto enorme mas vale muito a pena porque ele traz uma visão muito ampla. E aproveitando isso a gente tá linkando também uma dica que saiu no Catraca Livre a respeito de um blog para vocês aprenderem fazer cisternas! Isso mesmo fazer cisternas em casa e fazer um bom aproveitamento da água da chuva e ainda sobre esse tema uma matéria que saiu na Folha editorial da Folha entitulado omissão criminosa um título super forte né Ju e ele vem falando realmente sobre essa não só no caso hídrico né aqui a nossa crise hídrica e a falácia do Alckimin de setembro falar que NÃO HAVERÁ e a gente passando esse sufoco agora mas também na caso da crise de luz que foi muito parecido né? A omissão da Dilma durante a campanha de não ter falado sobre isso e agora…
Ju: é que são duas coisas que tem um pacto social muito grande então assim, sem água não tem dignidade quanto mais é organização social não tem como e a eletricidade impacta diretamente em produção, em salário, em renda enfim são coisas básicas pra economia funcionar pra vida das pessoas então a omissão de informação de passar pras pessoas a gravidade você tá…
Cris: em benefício próprio né?
Ju: exatamente.
Cris: mas Ju, fiquei sabendo que você tá assistindo BBB!
Ju: menina! Descobri uns reality shows essa semana Bizonhos!
Cris: RISOS Bizonho é ótimo!
Ju: porque tem reality show de tudo mas os que a gente vai linkar essa semana, eles assim teoricamente, tem uma função social…
Cris: ah eu acho que sim.
Ju: reality show com função social, é isso mesmo?
Cris: a gente viu aqui um reality show…
Ju: conta do reality show de
Cris: de “modsa”…
Ju: é, de moda.
Cris: Modsa, de chorar! Então eles pegaram umas blogueiras de moda umas meninas bem nascidas, bonitas…
Ju: Suecas? Norueguesas?
Cris: vixe, esqueci! Mas vamos ver… a gente abre aqui e já fala. Mas essas meninas apareceram lá, pegaram essas meninas e mandaram para o Camboja, de um lugar de onde vem muitas e muitas peças de roupas que vestem nossos lindos corpinhos e assim, óbvio né, choque total pras garotas porque realmente é uma realidade muito crua né de escravidão, semi-escravidão – são norueguesas tá? – e pô, chega lá menina começou chorar que o desespero é esse? Horas e horas sem trabalhar sem nenhuma condição de vida e tudo mais. Eu acho bem legal o impacto, acho bem legal o choque fica o questionamento, eu ouvi isso muito, ‘qual é gata, você vai se preocupar de onde vem a roupa? Se prepara que você vai usar bem pouca”.
Ju: Exatamente.
Cris: Eu ouvi isso, não vamos citar marcas aqui porque eu acho que tem os comprovados, tem os suspeitos é compliacado.
Ju: porque são todas! É a mesma oficina. A minha família meu pai, minhas tias todas tem oficina de costura a mesmo oficina faz roupa pra todas as marcas.
Cris: só troca a etiqueta né?
Ju: É
Cris: então assim, qual que é a saída? Será que é fazer a própria roupa? Será que a gente tá indo para um nível bricolagem a gente faz cisterna, a gente faz roupa…
Ju:Eu já botei meus filhos na escola Waldorf, então to bem adiantada.
Cris: vamos pra lá! Vamos pra esse lugar. E qual que foi o outro reality show ai que você assistiu?
Ju: um reality show no Iraque que confronta Jihadistas e as famílias das vitimas.
Cris: Eita ferro!! O que que sai disso?
Ju: agora você pensa datena deitando e rolando no Iraque, mas é assim deitando e rolando.
Cris: Mas perai, o pessoal fica perguntando por que que você explode?
Ju: É sem tanta gentileza assim… é assim o reality show é praticamente um linchamento público assim, eles dão o gostinho, eles levam pro cara escutar o que as pessoas falam, ele sentir bem o bafo do ódio das pessoas no cangote dele porque o que esses… eu vou falar ‘criminosos’, o que esses criminosos passam pelo confronto da família das vitimas dos ataques terroristas deles. Então assim é ter que encarar…
Cris: Isso é promovido por quem? Esses cara tão presos né, ou não?
Ju: isso, sim presos. Isso é promovido pelo estado, é como uma forme de tipo ‘quem pecar vai pagar’, sabe?
Cris: é, eu acho que são os reality shows a serviço da dura realidade da humanidade.
Ju: bom agora falando em dura realidade 88 bilhões de duras realidades pra gente essa semana. Ninguém falava de outra coisa na minha timeline, foi uma avalanche, muita piadinha, a gente até pensou de trazer a piadinha mas o assunto é tão bizarro que precisamos tá… a gente falou tão mal, tão mal do Alckmin e a incompetência ela é generalizada…
Cris: ta rolando pra todo lado.
Ju: a galera se esforça bem e a competição é boa. O que que eu to falando pra quem ativamente evitou de escutar esse assunto. Segundo procurados do Ministério Público alguns executivos da Petrobras indicados por partidos políticos, aquele clássico cargo de confiança, conspiraram com empresas de engenharia e construção para sobrevalorizar refinarias, navios e outros ativos da Petrobras assim os valores excedentes dos projetos seriam desviados para esses executivos, político e partidos. Essa é a suspeita, a noticia da semana é que depois de dois meses enrolando falando ‘peraí eu só preciso… o cachorro comeu o meu balanço, não peraí eu só esqueci uma linha, é… agora eu vou passar a limpo, passar a caneta sabe?’. Depois de dois meses enrolando a Petrobras finalmente divulgou o balanço do Terceiro Trimestre de 2014 sem as perdas decorrentes das denuncias de corrupção que teoricamente era o que tava atrasando a publicação do balanço.
Cris: eu queria ler com uma voz fúnebre o que a executiva do comunicado disse, abre aspas “o resultado das avaliações indicou que os ativos com valor justo abaixo do imobilizado totalizaram 88,6 bilhões de diferença a menor”.
Ju: É eu ouvi o triconomics na CBN hoje e um dos caras falou que esse valor, só pra gente ter referência né, porque quando passa de sei lá cem mil reais pra nós tanto faz…
Cris: eu fico tentando imaginar o montante… o que que são 88 bilhões.
Ju: então pra gente entender 88 bilhões é igual ao patrimônio somado de todas as empresas brasileiras fora as 4 maiores que é Petrobras, Oi, ele não lembrava mais… mas enfim
Cris: a Petrobras não mais por muito tempo desse jeito.
Ju: é mas assim 88 bilhões… assim, todas as empresas brasileiras somadas o patrimônio, menos as 4 maiores, o patrimônio dá isso. então assim pode se dizer que é uma caralhada de dinheiro, eu acho que é seguro dizer.
Cris: eu acho que sim.
Ju: e assim, esse 88 bilhões não é uma cifra exata é por uma metodologia de cálculo que tem toda uma explicação de porque as metodologias que eles tentaram porque que não funcionaram e essa metodologia que eles não acham que é a mais correta mas é o que temos para o momento.
Cris: então o que que ainda tá nebuloso nisso aí? Tem duas firmas globais reconhecidamente, internacional, já ganharam Cannes, Globo de ouro e Oscar que eram os avaliadores independentes e por que não tem transparência nisso? Por que que a PWC não assinou o balanço agora? Então a maquiagem ela acontece há muito tempo e tem sim essa conveniência, é o dito cambalacho na hora da declaração. Então qual que é a credibilidade dessas empresas aí que assinam o balanço sem vir a público pra poder emprestar a credibilidade dela.
Ju: que credibilidade se ela não está falando em público né, complicado… assim a gente sabe que corrupção é uma parte do problema mas outra parte que tá bem claro aí é o malabarismo contábil, que assim, atire a primeira pedra a empresa particular que não faz malabarismo contábil porque isso tá bem disseminado é um câncer bem disseminado, inclusive agora a última moda antes das eleições foi em contas públicas né? Teve uma gritaria aí que a gente começou a ver esses malabarismos contábeis sendo feitos em contas públicas também, então algumas coisas do tipo, putz não vou lembrar mas sei lá atrasar salário pra entrar no exercício seguinte sabe? Algumas coisas bizarras…
Cris: É são pequenas coisinhas ali que vão se encontrando brechas e fazendo pequenos…
Ju: É sei lá atrasar investimento pras contas no balanço de final de ano fecharem e na verdade você só adiou custos que precisavam ser feitos que já haviam sido provisionados enfim, o malabarismo fiscal ele é bem feito nas empresas está sendo feito agora em contas públicas então é um pouco de precisamos falar sobre contabilidade que ninguém gosta que é chato mas que no final essas decisões impactam a vida de todo mundo né?
Cris: É eu fiz errado a minha declaração de Imposto de Renda e já olharam lá… e o pior eu não lembro o que eu fiz errado porque eu vacilei mas já descobriram. Meus 26 reais…
Ju: Ah mais isso…. ou seja, burra a galera não é né?
Cris: não, não é não!
Ju: Não é incompetência não é falta de vontade mesmo.
Cris: a gente não entra aqui, mas só pra deixar mesmo a pergunta pros ouvintes. É o maior escândalo de corrupção da nossa história? Será que isso é sensacionalismo? O que que tem por trás disso? Tem outros escândalos que não vieram a tona? Ele ta sendo tão falado porque ele é do PT? Então assim, acho que tem muita leitura para ser feita né? O coleguinha roubar não justifica você roubar também, mas acho que tem ainda muita leitura pra ser feita muita coisa se aprofundar aí e pra entender melhor.
Ju: o que eu entendi, eu tava falando mais da questão econômica aí que tem a questão de que o governo faz uso político das empresas que ele tem. Então por exemplo, a Petrobras foi prejudicada porque a Dilma segurou o aumento dos combustíveis pra segurar a pressão inflacionária e a Petrobras por outro lado se “ressarcia” através disso através de benefícios fiscais e negociações fiscais então diminuiu muito a arrecadação da Petrobras, isso é ruim porque, Petrobras é empresa de capital aberto então tem um monte de acionista que tá sendo prejudicado com o valor da empresa diminuindo pra se conseguir um fim público.
Cris: quem não conhece né? Quem comprou ações da Petrobras com suado dinheirinho porque pré-sal, porque ia mega valorizar. A gente não ta falando desses caras que ganham milhões que tem milhões de ações. A gente tá falando da pessoa física mesmo que vai ali tentar fazer o seu dinheirinho render um pouco melhor. É isso pessoal, é o que temos né pra essa semaninha aí dura né… um rombo leve de 88 bilhões aí pra digerir e entender melhor eu acho que tem muita informação aí ainda que precisa ser cavoucada.
Ju: politicamente a questão que se coloca é sobre financiamento de partidos né, que se a gente não discutir isso corretamente eles vão… você tapa um buraco eles fazem buraco em outro lugar então assim ou a gente discute financiamento de campanha ou esse tipo de escândalo vai continuar acontecendo.
Cris: é isso aí!
Ju: Bom vamos então para a Teta da semana que vamos fazer sobre ortotanásia. Primeiro por que que a gente vai falar sobre ortotanásia? Essa semana foi divulgada uma decisão inédita da justiça brasileira autorizando uma advogada a não ter que passar por tratamento desnecessário caso ela desenvolva no futuro uma doença irreversível que comprometa a capacidade e consciência. Deixando claro ela não tem nada hoje ela tinha um testamento vital e ela buscou a justiça para garantir que esse testamento vital seria respeitado.
Cris: Amiguinhos, testamento vital saberemos a seguir.
Ju: Você explicar um pouco pra gente o que é testamento vital Milena:?
Milena:: vamos lá, no Brasil isso é mais novo né. Em outros países enfim, isso já é tão velho que a criança nasce e sabe o que é testamento vital porque isso tá na parede do quarto, tá na porta da geladeira do avô dela enfim do pai e da mãe. Então o testamento vital na verdade é aquilo que a pessoa decide. E acho muito legal porque enfim o que motivou nosso encontro aqui foi a questão da advogada que não tem nada agora, não tem uma doença que a gente pense que pode ser crônico ou degenerativo que leva a morte mas ela falou assim “olha eu não quero tratamentos desnecessário”, então você decide assim nos estados unidos isso tá bem documentado e tem até uma questão assim “pra quem que eu vou deixar os meus bens, de quem eu quero que decida caso eu não tenha consciência pra fazer isso”. Então se fala eu quero ir pra UTI ou não eu quero ser enfim respirar por aparelhos ou não a ventilação mecânica – eu vou usar aqui os termos que tem todo um… qualquer cidadão conhece – se eu quero que o meu rim seja substituído ou não, fazer hemodiálise esse tipo de coisa, então essas peculiaridades né. O que se fala no Brasil é que a gente não tem maturidade enquanto sociedade pra conversar sobre isso e a minha presença aqui é porque eu acho que a gente tem sim maturidade pra conversar sobre isso e enfim pra desmistificar muita coisa porque é agora que a gente tem que decidir, quando a gente tá bem porque quando chega no momento é muito difícil então o testamento tem a ver com isso.
Cris: ô Ju e se eu quiser fazer o meu testamento vital agora que eu descobri o que que é, e se eu quiser fazer como é que faz?
Milena:: Eu ia só fazer um comentário que eu acho que o nome não ajuda muito né? Que é uma tradução errada ao pé da letra do conceito de living well nos Estados Unidos que o well seria vontade não testamento então uma vontade em vida por isso que o nome também é diretrizes antecipadas feitas em vida e eu já cheguei a entrevistar uma vez pro blog a Luciana Dadauto que é uma porta voz do testamento vital aqui que ela tem o site testamento vital.com.br e lá ela explica o passo a passo que eu acho interessante ela criou um banco de dados também que você pode ir lá o seu testamento vital e dar uma senha pra algum familiar ou algum amigo poder ir resgatar acessar e ela recomenda que seja lavrado como uma escritura pública que é para aumentar as chances dele ser respeitado.
Cris: Nós vamos linkar no post aqui esse site e essa história da Dra. Dadauto que tem defendido esse testamento vital pras pessoas entenderem um pouco melhor, visitar o site entendendo bem como elas podem fazer isso.
Ju: é só pra dar um dado, te dou um dado, sobre o tamanho do problema a relevância do problema no Brasil morrem aproximadamente um milhão e cem mil pessoas por ano sendo que 800 mil morrem de morte anunciada câncer doença crônica ou degenerativa então a gente tá falando de universo gigantesco de pessoas que pode ser beneficiada ou não por essas decisões prévias. Então só vou falar um pouquinho sobre o que é ortotanásia e quando a gente falou que ia falar sobre isso no Twitter pessoal falou que não sabia que era isso igual a gente também não obviamente. vou falar primeiro um pouquinho da etimologia do termo orto significa correto, reto, direito, justo por isso a definição de que é ortotanásia é morte natural normal essa é definição do Houhaiss. No sentido figurado ortotanásia significa uma boa morte supostamente sem sofrimento. Outras definições é omissão de uma indicação terapêutica pra determinado caso, é omissão de toda intervenção que possa prolongar a vida uma forma artificial, é a atuação correta frente a morte, é a abordagem adequada diante de um paciente que está morrendo. É… a ortotanásia ela se contrapõe a distanásia que é o prolongamento exagerado da morte de um paciente terminal ou tratamento inútil não visa prolongar a vida mas sim o processo de morte. A distanásia a gente leigamente conhece como se escuta na conversa de familiares, de pacientes terminais medidas que os hospitais às vezes tomam pra prolongar a vida do paciente porque esse cuidado dos últimos dias é o cuidado mais caro então tem até um estudo não vou lembrar de que 80% dos gastos de saúde de toda a sua vida não ser feitos nos últimos dias de vida. Então assim, existe uma discussão ética muito grande sobre até que ponto você tá fazendo porque é melhor pra paciente até que tá fazendo você tá fazendo porque é lucrativo. Então tem esse pano de fundo também na discussão e aí se a gente parte para o caminho da ortotanásia, de entender que não existe a morte já é inevitável é só uma questão de como a gente vai chegar até lá a gente automaticamente cai no cuidado paliativo que não é simplesmente deixar negar atendimento que eu acho que assim, isso que é o sofrimento de muito médico que tem muito médico que se sente desconfortável com a ortotanásia é porque parece que ele tá negando atendimento pro paciente, que ele tá sendo omisso no tratamento. E aí não é ser omisso no tratamento é trocar a visão de tratamento que é parar de tratar a doença e passar a tratar o paciente, a pessoa.
Cris: eu queria que a Jussara falasse um pouquinho porque como a gente tem termos diferentes tentar diferenciar um pouquinho pros ouvintes e pra mim também essas diferenças, a gente tem os contrapontos que é a ortotanásia e a distanásia a gente tem a eutanásia que você fala ‘beleza como é que morre?’. Como que essas terminologias definem melhor a morte?
Jussara: É muitas pessoas definem a ortotanásia como um meio caminho entre a distanásia e a eutanásia. Se for ver na terminologia eutanásia vem de Euthanatos do grego também é uma boa sorte só que é uma morte que é o processo de morte acelerado com uma assistência por isso ela é tão polêmica por que envolve conceitos religiosos, envolve fé das pessoas, religiosidade e as próprias leis dos países as constituições. No Brasil a eutanásia é crime então qualquer pessoa que assista um paciente aceler a sua morte é considerado que cometeu um homicídio, certo? Há países que não é crime na Holanda não é crime acho que na Bélgica na França é. Então nesse sentido, é só um adendo, o cinema toca muito nesse problema em vários filmes e aí dependendo do país é tratada de forma diferente. O último filme que toca nessa questão é o Amor do Michael Haneke que chocou muita gente e muita gente adorou e é um filme que toca exatamente na sutileza, na delicadeza, na complexidade dessa questão da escolha e o filme mostra como é frágil o limite entre esses termos entre esses procedimentos o que seria uma ortotanásia e uma eutanásia até onde eu tô praticando uma ortotanásia e até onde vai passar a ser uma eutanásia. Mas enfim, o código penal brasileiro é muito rígido nesse sentido porque a Constituição o direito à vida além de inviolável é indisponível ou seja…
Ju: ninguém pode abrir mão dele.
Jussara: nem a própria pessoa que tem o direito eu não posso abrir mão da minha vida então se eu pedir para alguém me assistir, me ajudar a morrer e essa pessoa me ajudar a morrer então pra falar em termos bem simples e eu realmente efetivar a ajuda essa pessoa pelo código penal brasileiro cometeu um homicídio ela pode ser penalizada em ser presa certo? Mesmo que eu tenha pedido, não importa, pela constituição eu não tenho esse direito de dispor do meu direito à vida eu não tenho pela Constituição esse direito.
Ju: O que o Conselho Federal de Medicina considerou quando ele deu um parecer favorável a ortotanásia foi que a dignidade humana tá acima desse princípio tá, então vida tem que ser considerada quando ela tem dignidade.
Jussara: Mas eles eles formaram uma comissão de pra consultar né um sistema de trabalho que tinha até um teólogo que tinha especialistas em cuidados paliativos, geriatria, bioética, pastor, procurador ou procuradora da Justiça então pessoa que entendia de leis, uma pessoa de religião então tem um teólogo e pessoas da área médica pra ver como a questão é complexa e assim tem casos aí vários nos últimos sei lá oito anos que tocaram nesse limiar muito sutil e eu não sei se as pessoas vão lembrar vou tocar rapidinho no caso da americana em 2005 chamada Terri Schiavo vocês lembram que o marido pediu que fosse desligado. E aí é que esses casos mostram como é difícil essa questão porque quando você le a regulamentação do Conselho Federal de Medicina enfim é… a ortotanásia realmente que o paciente por escolha não quiser passar por esses tratamentos que vão prolongar uma vida que já foi determinada com uma doença que é irreversível então já se entrou no processo de morte aí sim a ortotanásia é aplicada e limita-se ou dispensa-se os cuidados que vão fazer o paciente sofrer na verdade ter uma vida que poderia ter um final de vida melhor…
Ju: mais curto.
Jussara: e aí Dizem que por exemplo quando é considerada morte cerebral encefálica não é crime certo se desligar o aparelho mas no caso dessa americana que eu citei ela se o aparelho continuasse ligado, a alimentação que ela recebia ela continuaria vivendo não pra sempre mas por ainda um bom tempo mas aí entre o caso que você falou que a Juliana falou de não haver consenso no final da vida entre os familiares porque o direito era do marido que não era mais, já tava até casado com outra. O pai e o irmão dessa americana queriam continuar cuidando dela independente dos médicos já terem atestado que ela vivia em estado vegetativo a alimentação só mantinha o corpo vivo mas ela está …mas por exemplo, o pai e o irmão não acreditavam que o julgamento dos médicos era definitivo, que realmente era irreversível podia de repente a filha podia voltar à vida eles não queriam que desligasse o marido tinha direito. E eles ficaram brigando durante 12 anos para conseguir cada um pro lado pai eo irmão querendo manter o marido querendo desligar os aparelhos e no final o marido conseguiu foi desligado tipo 18 de Março eu não lembro o ano exatamente acho que 2005 né e ela levou 13 dias para morrer…
Cris: de inanição.
Jussara: de inanição certo? então assim Ah o estado é vegetativo os médicos dizem que ela não sentia mais nada mas aí o pai e o irmão alegavam como vocês podem ter certeza absoluta que ela não sentia mais nada ela morre de fome e sede como você sabe que ela tá morrendo de inanição e não tá sentindo nada? Então assim é uma questão tensa.
Cris: Camila eu queria continuando nesse tema e voltando ao cinema Mar Adentro é um filme né… Javier Barden aquela coisa, aquele colosso interpreta só com olhar esse filme né porque ele está totalmente parado ali e ele fala é uma história real do Ramon Sampedro que é uma luta para… uma vida para morrer ele luta a vida inteira para morrer e a gente assiste o filme, não sei se porque era o Javier mas ele não morre tem uma cena que é muito interessante que a cunhada dele fala ‘seu ingrato a gente cuida de você há 20 anos a gente faz tudo pra você ser feliz e você é um egoísta’ então é você que tá sempre conversando sobre o Tabu da Morte é nós somos passionais demais pra permite que as pessoas morram? É por isso que pra gente é tão delicado falar de Ok é hora de parar?
Camila: E essa questão também aborda o suicídio. Eu fiz um post onde eu mencionava o filósofo Alberto Camus sobre o mito de Sísifo e um internauta fez um comentário, ele falou justamente isso ele falou ‘mas a vida é minha não tenho direito se eu quiser me matar eu tenho direito de me matar ou não?’. E aí Associação Brasileira de psiquiatria inclusive falou a respeito disso ela colocou como um mito ou fato de você ter o suicida ter livre arbítrio. Ela colocou como um mito porque ela parte do pressuposto de que quando você tem esse desejo de morrer eu tô fazendo uma analogia com essa história do Ramon quando você tem esse desejo você não tá em plena capacidade de raciocínio você não tá sóbrio, você está afetado, está num estado de choque e aí entra também essa questão da eutanásia que um psiquiatra que eu entrevistei pra falar sobre esse outro tema ele disse que o difícil quando você permite eutanásia e o suicídio assistido parte do mesmo princípio mas é a pessoa que toma os remédios né letais você tem que ter uma análise muito forte a ponto de diferenciar o estado deprimido por causa de uma doença crônica, debilitante de um desejo real.
Ju: é que eu acho que assim no nosso caso que a gente está falando de ortotanásia também é Um desafio porque? Porque a gente tá falando da recusa de prosseguir no tratamento e aí a gente sabe que muitos tratamentos são extremamente agressivos e as chances dele, e as chances de darem certo são pequena então até que ponto a pessoa tá empoderada pra tomar uma decisão e até que ponto você apoiando como família não tem que tomar a decisão por ela tipo vai doer que nem eu faço pro meu filho de 2 anos ‘você não quer tomar vacina, óbvio que você não quer mas cê vai ficar aqui vai doer mas vai passar’ o vale a pena lutar por isso então assim em que momento que a pessoa perde o direito a autonomia de escolher por ela então sobre é sobre essa questão de quando a gente perde o direito quando a gente deveria perder fazer essa discussão saber quem deve decidir o que vai ser feito com paciente a gente conversou um pouco como o psiquiatra João Figueiró ele vai dar um depoimento em fazer uma provocação pras meninas que estão na mesa.
João: muitos pacientes terminais perderam a capacidade cognitiva, a capacidade de julgamento e as vezes até a capacidade de expressar o seu desejo, as vezes a capacidade de falar. Eu penso que nessas situações devam ser tratadas de uma forma preventiva ou seja, o assunto da morte que é um tabu na nossa sociedade na maioria das sociedades seja um assunto que seja tratado entre os familiares muito antes da pessoa adoecer e que o desejo de cada um de nós possa ter sido comunicado por cada um de nós entre os nossos familiares ou aqueles que serão futuramente responsáveis por decisões tenham a oportunidade de ser claramente expressos num momento que estejamos de posse plena do nosso juízo, da nossa cognição, da nossa comunicação de modo que situações em que os familiares que tomaram a decisão e frequentemente quando isso não é feito previamente os familiares estão discordantes isso cria conflitos graves entre os filhos ou entre as pessoas que vão permanecer vivas eu penso que tem havido uma progressiva interferência da medicina e do estado em questões que são iminentemente de foro intimo tanto dos paciente quanto das suas famílias decisões quanto a morte a forma de morrer as condições de manutenção da vida me parece que são questões muito íntimas e privadas do paciente e da sua família. Minha pergunta à Dra Jussara e à Dr. Milena: é se elas não pensam que essas duas instâncias o governo e a medicina esteja exorbitando ou extrapolando as suas funções ao estabelecer por lei e através do código de ética aquilo que o próprio paciente a própria família poderiam decidir intimamente.
Milena:: Acho que tem… você tocaram em duas coisas super interessantes assim que fizeram o mundo mesmo, porque depois do caso da Terri assim as faculdades discutiram enfim o meio médico e acho que dos profissionais da saúde ficou bastante incomodado com isso né? E aí tem essa questão que a Cris falou de inanição. Não, ela não morreu de inanição ela morreu porque ela já tinha uma falência de múltiplos órgãos e tudo tava sendo mantido às custas de intervenção tecnológica que é a nutrição artificial à qual ela não tinha nem condição de absorver ela tinha diarréias assim homéricas o médico que cuidou dela… assim a dieta entrava né a dieta interal enfim que ia até o intestino pra que geralmente aquela sonda que coloca pelo nariz as pessoas já devem ter ouvido falar e aí enfim tinham que dar medicações pra segurar a diarreia porque o intestino não tinha condição de receber aquilo e absorver ela tinha… ela respirava… a questão cerebral já completamente enfim sem fluxo cerebral né uma pessoa que tá em estado vegetativo tem fluxo cerebral mas aquilo não funciona então eu já não tenho função cognitiva não tinha órgão vitais ela se mantinha às custas da tecnologia. Então eu acho que a grande coisa quando a gente pensa em ortotanásia é pensar até onde vai a tecnologia. Assim mesmo quando a gente discute o parto humanizado e a intervenção tecnológica em cima disso se isso é certo ou não se a gente enfim por que que o parto agora domiciliar é um negócio que não pode ter sendo que se a gente for ver as nossas bisavós e as nossas avós várias tiveram 15 não é 1 ou 2 e agora você não pode ter porque poucos obstetras fazem isso e os que fazem fazem muito bem. Agora quando a gente olha pra morte a morte ta cada vez, na verdade ela saiu de dentro das casas porque elas já aconteciam dentro de casa …
Cris: os velórios aconteciam dentro de casa.
Milena:: os velórios… Assim as igrejas sempre tinham velório, velório era uma coisa que fazia parte, as crianças sabiam como era morrer porque morria alguém em casa.
Jussara: as crianças também ficavam no leito de morte com os pais, os tios, os familiares acompanhando o processo do morrer, o processo do morrer você falou muito bem o processo do morrer estava próximo de nós, nós fomos afastando, afastando, afastando o processo do morrer tem gente que diz que a agente higienizou o processo do morrer o mais longe… pra colocar a morte o mais longe de nós que fosse possível porque…
Cris: porque ela dói?!
Camila: porque ela dói porque ela é terrível é isso que eu pesquisei no meu mestrado porque é duro de enfrentar porque a gente tem medo e porque com o movimento da ciência a gente foi ganhando mais confiança de que a gente pode viver mais de que a gente pode progredir de que agente pode ter…
Ju: a morte é uma traição…
Camila: É…
Ju: é uma traição de tudo o que nos venderam.
Camila: sempre foi entendeu. O Ernest Becker que eu pesquisei dizia que o primeiro choque foi aquele que aquele primata, primata não mas aquele primeiro hominídeo lá atras quando percebia os companheiros ali morrendo e ele olhava para aquele universo maravilhoso e pensava ele diz que o choque foi logo que ele desenvolveu a consciência. Quando a consciência surgiu e o que seria o homem falou EU e percebeu EU morro primeiro choque foi aí e esse choque permaneceu…
Cris: Se vivo logo morro.
Camila: Isso! você falou muito bem. Se vivo logo morrerei inevitavelmente entendeu? A Dra. falou muito bem.
Milena:: e a ciência na verdade assim colaborou com isso porque os gregos na verdade tinham a coisa do !!! hill lex (hipótese – não achei o termo correto) E aí vem o letal, então as pessoas que tavam enfim morrendo, não sei se lembram meu da Família Dinossauro? O dinossauro quando ele tá morrendo ele começa a ir para aquele desfiladeiro…
Cris: do filósofo não, mas a Família dinossauro lembra perfeitamente!
Milena:: enfim eles se dirigiam para aquele desfiladeiro é a mesma coisa é bacana. E assim, e aí a ciência faz isso né e pega os profissionais de saúde assim não pode morrer é uma luta. eu tava lendo isso hoje revisitando os meus textos que eu tinha pegado em 2011 sobre esse tema que foi quando eu entrei primeiro contato com isso por questões pessoais e também do meu trabalho né meu pai adoeceu e eu vivi toda essa situação.
Cris: enquanto você fazia a tese?
Milena:: enquanto… é… meu pai adoeceu antes de entrar no mestrado mas a doença os médicos ótimos tem realmente tratamentos muito avançado medicamentos avançados que diminuem a aceleração, desaceleram a doença porque o Parkinson como outras é degenerativa Então quando você é diagnosticado você sabe que inevitavelmente você vai degenerar mas assim os remédios retardam os médicos muito bons retardaram por um bom tempo mas a idade avançada, o meu pai é foi um pai tardio meu pai tinha uma idade avançada a idade avançada acelera o processo então quando eu estava redigindo a versão final foi que ele piorou então assim eu redigir com ele piorando terrivelmente entreguei eu defendi em novembro ele morreu em fevereiro então assim eu defendi e fui pro hospital com meu pai passar Hospital home care enfim a doutora sabe qual é o processo e aí eu comecei a ler e nesse material que eu li na época me chamou muito atenção sobre isso assim como é o enfrentamento disso e como falta a medicina a forma de treinar os médicos tradicional é pra que lute sempre pra viver pra vencer a doença.
Jussara: e olha só o que a gente vê a formação é assim, os seriados médicos todos são assim. Quem que morre no House gente? Ninguém. Quem que morre no E.R.? Toda parada cardíaca sai.
Milena:: acho que essas de médico que eu assisti até hoje a única que eu vi mais mortes foi Grey’s anatomy, que morre mais gente que é questão da dramatização, mas assim você falou bem, é uma luta desesperada dentro dos hospitais pra…
Camila: tem aquela série Six Feet Under que é A sete palmos que todo episódio começa com alguém morrendo.
Milena:: Isso! Isso! Que é uma série sensacional. Pra quem gosta desse tema super legal que é a morte eu recomendo essa série…
Ju: pra quem é vivo e um dia vai morrer essa série é muito pertinente!
Milena:: Isso, falou muito bem Juliana
Cris: bom, fica aqui um disclaimer não sabemos nascer e não sabemos morrer. Precisamos falar sobre isso…
Ju: é, eu queria, como você tava falando sobre o médico ele ser muito preparado pra salvar salvar salvar o meu padrasto que me criou ele é médico vascular e eu lembro e assim como ele tratava nas palavras dele de gente fu porque era só pré diabético era… ele só pegava tranqueira mesmo eram sempre cirurgias enormes 12 horas de cirurgia e não sei o que e eu lembro muito pontualmente dos pacientes que ele perdeu ele perdeu pouquíssimos pacientes eu lembro a depressão que ele ficava eu lembro que ele ficava mal ele sentia uma falha pessoal e tal. E aí a gente vai pro outro ponto que seria a alternativa que existe pra não ser um cruzado um médico cruzado que vai numa cruzada a favor da… contra as doenças e contra a morte é o cuidado paliativo e aí tem a própria brincadeira que a doutora Ana Cláudia fala que paliativo já parece remendo né já parece que ah você vai abrir mão de ser de Deus o cara que chega lá e resolve…
Cris: cadê o glamour?
Ju: é cadê o glamour? Você é um tapador de buracos você é o remendador né. Você não tem mais nada pra fazer que o cara brincava
Camila: faz a gambiarra.
Ju: você não tem mais nada pra fazer e dá um jeitinho aqui…
Justara: eu acho que o preconceito com isso até é um impacto grande no próprio paciente na família nos familiares…
Ju: chegou a hora do tratamento paliativo… ferrou
Justara: porque se o médico chega e fala porque é porque se o medico chega e fala pra você olha agora tratamento paliativo, foi o que aconteceu com o meu pai vai pra casa tem um home care será feito tudo o que for possível inclusive pra ver se ele melhora um pouco mas só falar quer dizer, eu lembro o choque da minha mãe quando a médica disse que ia mandar o meu pai pra casa e movimentou tudo pra que a Seguradora e tal escolhesse o home care etc e todo aquele processo pra minha mãe foi um choque, mesmo pra mim que já tava mais preparada digamos assim…
Ju: teoricamente…
Jussara: teoricamente mas na hora h aquilo é um choque você fala como assim vão parar de batalhar é a sensação que você tem. Vão parar de batalhar?
Cris: perdi? Perdi?
Ju: fala um pouquinho pra gente Milena:…
Cris: mexeu com a Milena:! A Milena: se arrumou na cadeira e falou…
Jussara: não… mas eu falei porque é legal porque a doutora aqui pode falar aqui como um médico se sente nisso né?
Camila: até pra… só pra complementar fizeram um ranking onde o Brasil foi considerado uns dos piores países pra se morrer, e eu queria…
Cris: mas tão mal hein nem pra morrer?
Jussara: morre-se muito mal no Brasil…
Camila: morre-se mal no Brasil…
Jussara: mais um ranking…
Milena:: saiu na the economist…
Camila: é mesmo na the economist?
Jussara: saiu na 40, acho que foi 40.
Camila: eu perdi essa. Eu vou procurar esse artigo.
Cris: tamo mal de morte.
Ju: então fala um pouco pra gente sobre cuidado paliativo. O que é, pra quem é, por que é.
Cris: o que é né?
Ju: exatamente.
Jussara: e o que que é morrer bem também?
Milena:: cuidados paliativos em 5 minutos.
Cris: o que que é boa morte?
Jussara: o que é uma boa morte?
Cris: eu tive um colega na escola que o sobrenome dele era Boa Morte, isso sempre me intrigou pra caramba. Ele chamava Marcio Boa Morte.
Milena:: toda cidade menor tem uma Boa Morte. Uma rua chamada Boa Morte…
Jussara: a minha vó era católica do interior de Portugal super religiosa e quando ela veio pro Brasil primeira coisa que ela fez foi procurar a igreja e dentro da igreja tem uma espécie de sociedade da boa morte. Não me perguntem eu não sei exatamente o que é porque eu era muito criança e não lembro mas eu me lembro direitinho de ela ir nos encontros enfim, discutia-se morte. Discutia-se como morrer bem, certo? Claro era dentro dos preceitos religiosos mas era o que se discutia.
Ju: fala Dra. Milena:
Milena:: adorei as cutucadas aí, vamos lá RISOS. tem uma coisa bastante importante porque assim a gente traduziu ipsis litteris de novo igual o testamento vital a gente tenta falar olha é diretivas antecipadas de vida, tenta chamar assim mas não rolou. E aí tem outra coisa que é o paliative care. E aí paliativo é remendo mesmo né, o meu carro não tá bom eu fui no mecânico e aí ele fez negócio paliativo e depois eu levo na autorizada, não é assim? É, caiu o teto você dá aquela arrumada que não dá pra fazer melhor e tem um grupo de estudiosos aí que defendem que a gente tem que mudar o nome então assim um dos maiores centros de Oncologia do mundo que é Mid Anderson lá não fala Cuidado paliativo lá se fala suportive care. Suportive cancer…
Camila: de apoio.
Jussara: acho que eu já escutei…
Camila: suporte
Milena:: suporte né? Enfim alguns hospitais em SP o instituto brasileiro de controle do câncer também não fala cuidado paliativo usa-se o termo controle de sintomas eu faço cuidado paliativo lá e esse é o termo que se usa. Obviamente assim né no Instituto do Câncer o Ifesp a gente optou por chamar de cuidado paliativos e enfim é levantar a bandeira de que o nome é o menos importante não sei se a gente tá sendo mal marqueteiro ou de alguma forma enfim achando que o que se faz é mais importante né? E aí um grande preconceito disso é que se fala de cuidado paliativo quando o cara realmente está no bico do corvo. Então a doença já tá muito ruim, lógico que nesse momento alguém que tem uma expertise e não é só o médico, é uma equipe multiprofissional é uma galera que sabe cuidar com esse tipo de paciente sabe lidar com a família eu preciso de especialistas neste momento eu preciso de gente que sabe fazer só que tem antes toda uma doença a pessoa já passou por dor passou por várias intervenções que doeram que assim tiveram que sair de casa de madrugada pra enfrentar fila de hospital enfim pra conseguir fazer o exame então a senhora…
Cris: a pessoa fica muito exposta…
Milena:: muito exposta, assim a vou fazer a tomografia amanhã, puxa a noite anterior é de uma família que não dorme uma família que fica com aquela expectativa aí eu aguardo pra ver o médico aí o médico chega assim olha aqui não tá funcionando aquele remédio que eu dei pro coração então não fez nada são momentos muito difíceis então a gente acha mesmo acredita que todo profissional de saúde tem que ter uma formação em cuidados paliativos não pro final porque talvez eu precise do expert mas nesse meio de campo assim entre o diagnóstico e tudo que se passa… o diabetes não tem cura minha gente é assim a pessoa emagrece tal mas ele é um diabético.
Camila: e comunicação também né? Parece que 80% das reclamações são problemas de comunicação do médico com paciente.
Cris: reclamações do paciente?
Camila: reclamações no CRM.
Milena:: eu concordo com isso. Da mesma forma que a gente tava falando da aprovação do conselho federal de medicina do processo da ortotanásia e com o ministério federal aprovando isso em 2010 que tinha que mudar inclusive treinamento dos médicos desde a faculdade pra prepara-los pra isso é a mesma coisa com o paliativo.
Ju: só vou fazer um parenteses o que acontece Ministério Público só tirou a liminar que suspendia a determinação do conselho Federal não existe previsão legal na legislação brasileira pra ortotanásia mas existe sim uma lei que está tramitando e existe uma jurisprudência favorável a ortotanásia.
Milena:: favorável isso.
Camila : Mas tem uma lei que permite que, a gente tava até comentando, permite que o paciente rejeite tratamentos né.
Ju: isso! Mas isso é uma lei estadual não é uma lei federal.
Milena:: eu só vou retomar um pouquinho porque a hora que a gente fala de Formação a hora que o centro no médico mesmo eu faço isso ser médico centrado eu perco. eu perco porque os outros são tão importantes quanto nesse processo o adoecimento de doenças crônico-degenerativas incuráveis e qualquer abalo então assim um indivíduo jovem que bateu o carro e vai pra uma UTI é passível de receber cuidados paliativos seja através de medicações pra dor e pra controle de sintomas eu não tô abrindo mão de fazer o que cura mas eu estou agregando valor eu tô me comunicando bem então a grande coisa como é que você se comunica.
Ju: mas o que que é paliativo pras pessoas entenderem que sentido é paliativo eu tratar um jovem que está na UTI por um acidente por exemplo.
Milena:: toda doença que tem risco de morte é passível de cuidado paliativo e ai gente tem enfim a definição de Organização Mundial da Saúde que é uma abordagem cuidados paliativos é uma abordagem
Camila: ameaçadora de vida né?
Milena:: toda doença ou qualquer agravo ameaçador de vida.
Ju: que abordagem é essa?
Milena:: é então essa abordagem envolve uma equipe multiprofissional e ela é basicamente de controle de sintomas naqueles momentos mais precoces em que eu ajudo as equipes outras seja de cardiologia de pneumologia de oncologia através do bom controle de sintomas e aí se fala de dor mas de outros aspectos que antes nunca foram vistos nessa além da questão social psicológica e a gente aborda também além da parte física a questão espiritual. Então a hora que você fala numa definição que eu vou abordar a questão física com tratamento impecável da dor e de outros sintomas mas eu vou ver uma abordagem social psicossocial também espiritual eu faço o indivíduo ser autônomo né? Eu faço eu respeito a autonomia dessa pessoa então assim a hora que a… eu esqueci o nome da advogada meu que entrou com o testamento que fez o…
Camila: Rosana.
Milena:: esqueci o nome dela eu li hoje e enfim me passou…
Jussara: parece que ela trabalha com processos relacionados à doença doentes
Milena:: sim enfim os direitos dos pacientes…
Jussara: ela alegou numa das entrevistas que essa foi uma das razões pra ela ter…
Milena:: viu muita gente
Jussara: viu muita gente adoecer e ter problemas com familiares.
Milena:: gente eu tenho meu testamento vital.
Jussara: aonde tá?
Cris: eu to chateada que eu não tenho. Vou fazer esse trem.
Jussara: eu não tenho também, acho que eu vou fazer.
Milena:: a gente conversou com todos os médicos residentes que passam conosco assim e são quase… eu sou uma das responsáveis pela formação de médicos residentes que passam com a gente no instituto são quase cem, cento e vinte por ano. É um número grande né. E assim olha você já fez seu testamento vital? Você pensou na hora que chegar e aí que você quer? E a gente assim tem um instrumento bastante interessante que depois eu acho que dá pra colocar no link aí que faz parte do treinamento de empatia american e eu tive lá enfim fiz um treinamento e eu traduzi enfim ela me deixou é uma psicóloga enfim traduzi e eu aplico no primeiro dia que eles passam comigo, chama exercício de perda. Então você coloca, são 5 colunas e enfim tem as coisas que você mais gosta, partes do corpo que você mais enfim gosta em você mesmo sentimentos e pessoas. Aí você vai colocando em ordem decrescente de mérito tudo isso e aí vou contando uma história é uma história de uma mulher com câncer. Ah então um dia você acorda tal e sente um nódulo na sua axila. Ah tudo bem, 2 semanas depois o nódulo ainda está lá corte 2 itens e as pessoas vão cortando os itens dessa tabela que foi feita. E aí depois agente conversa no final da história tem que tá cortado se você conseguiu cortar ou não, como é que foi. Esse faz parte do treinamento de empatia meu amigo a hora que você for atender esse paciente ele já cortou tanta coisa, ele já não vai mais no cinema, ele já não tem dinheiro ele já tá ferrado e em geral as pessoas cortam por último alguns sentimentos e as pessoas. Assim quando eu fiz foi bem interessante que eu fiz fui cortando coisas materiais enfim partes do corpo tal e aí chegou na hora de cortar sentimentos e pessoas e eu cortei todos os sentimentos o último era fé, enfim o último que era o primeiro né pra mim em ordem crescente falei assim caramba nessa hora vai ate as fé antes das pessoas…
Camila: tem autonomia ali junto? Autonomia é uma possibilidade pra cortar ou não?
Ju: você que escolhe, você que botou.
Milena:: cada um pode botar os seus, enfim do que eu cortei o último sobrou fé, eu falei olha fé vai fé e só ficam as pessoas e aí tinham as pessoas e eu achei que aquilo valia nota e ela ia pegar aquilo de mim enfim aí eu fiz um exercício assim eu coloquei meu pai minha mãe enfim meu irmão meu sobrinho que tinha acabado de nascer antes de eu viajar e meu namorado. Aí eu falei bom, namorado a gente arranja outro…
Todas: RISOS
Milena:: Meu pai é mais velho…
Cris: ele não ouvir esse programa né?
Milena:: então, hoje ele é meu marido, ele já sabe o resultado… o legal é que muda a sua prioridade né…
Cris: ouviu né marido? Então tem um desconto…
Todas: RISOS
Milena:: e aí enfim eu fiz um baita raciocínio, meu pai é mais velho, minha mãe e tal quem morre primeiro, meu sobrinho tem que viver ele é criança e Tem sido bastante interessante ver como é que médicos mais jovens têm respondido e como é que ele vão olhar para os pacientes depois geralmente essa devolutiva deles pra gente o feedback é bom. Eu nunca tinha pensado que correr pra mim é importante aí eu to no leito do hospital e não posso mais fazer isso, mas isso é realmente menos importante que olhar, ter olhos pra enxergar, enfim…
Cris: é… eu sou mineira e…
Milena:: gosta de pão de queijo!
Cris: Ô!! E o que acontece eu não percebo, claro que a minha família não ta aqui então não tem tanta essa percepção, eu acho mineiro apegado demais, sabe a gente tem uma dificuldade de abrir mão e a mamãe trabalhou com pessoas a mamãe já morreu de mão dada com uns três e ela cuidou de pessoas no final de vida e com problemas muito sérios e tudo mais e até que o tio preferido dela adoeceu e o meu tio foi (meu tio avó né) ele foi adoecendo aí ele tinha um câncer o câncer foi foi deixando ele muito debilitado e a coisa foi evoluindo e ele já tava em casa e o câncer continuou crescendo quebrou costela dele ele ficou todo encurvado e a minha mãe falou que nós vamos lá e vamos fazer isso com ele vai fazer aquilo agora sol agora comida agora hospital. Falei mãe tem uma hora que isso para. TEM? NÃO, NÃO PARA NUNCA a gente ama a gente cuida. e aí ele passou por um processo que eu não consiga entender aquilo como vida e aí quando ele morreu ela ficou muito mal ela ficou arrasada ela mas se a gente tivesse feito isso se a gente tivesse feito aquilo cara pára por favor. E aí eu acho que eu acompanhei algumas mortes neste sentido e o me eu refleti muito. Isso é vida? E o conceito da palavra dignidade, eu lembro que ela é uma pessoa muito religiosa ela cuidou um tempo de uma uma mulher que teve câncer na vagina e no final ela não tinha mais forma essa mulher ela ficava deitada a perna dela ficava aberta ela ficava com lençol e era horrível ela parecia que tinha um monstro no meio das pernas dela mas as pessoas da igreja arrecadavam dinheiro pra dar remédio e tratamento alternativo E aí se tenta de tudo se tenta de tudo e eu cresci com esse negócio, isso é vida? O que que define?
Ju: então quando você vê a definição a definição ela parece muito clara não parece ter muito motivo para discussão assim porque Ah quando for irreversível então vamos parar de tratamentos heróicos de medidas heróicas e deixa a pessoa em paz na qualidade de vida e tal só que a vida ela não é tão organizadinha assim e esses limites são bem borrados então assim é não me parece muito fácil saber cravar o martelo do que é irreversível né? Então assim eu acho que é isso que geram as maiores discussões porque o quanto eu tô disposto a lutar e quando não sou eu que vou decidir quem ficou ao redor quem vai decidir que coisas eu posso me submeter para que eu numa tentativa desesperada de viver né? Então assim acho que você como passa por isso sempre pode falar pouco melhor sobre a clareza se a gente tem clareza de quando é inevitável a gente já entrou no processo inevitável, quando que a pessoa pode perder essa autonomia quando ela deveria perder autonomia e como é pro médico intermediar esse conflito né?
Milena:: Eu começo falando que tem alguns marcadores em medicina que eles ajudam a gente né como um profissional de saúde a entender as doenças o grande problema é que não se fala sobre isso então eu falo que eu vou te dar… olha você é hipertenso, você tem diabetes enfim a gente descobriu aí um câncer de próstata né eu posso tá falando de um senhor de 70 anos e aí aos 70 anos essa pessoa tem um câncer e ele enfim já passou por vários tratamentos de quimioterapia enfim fez algumas intervenções cirúrgicas e agora ele tá num momento completamente acamado porque tem tanta metástase no osso eu tô dando um exemplo pra falar que esse é o meu dia-a-dia ele nem se levanta da cama, os rins já não funcionam porque a idade é um marcador biológico grande nisso o envelhecimento dos órgãos e junto com isso todas as outras doenças e intervenções que ele fez que machucaram de alguma forma e prejudicaram o funcionamento dos órgãos. Então eu consigo saber através de examinando, conversando olhando o histórico com exames de né tomografia, ressonância exames de sangue que eu tenho envelhecimento e aí esse paciente interna, eu não vou dar antibiótico? Claro que vou. Se ele tiver uma infecção. Só que aí eu percebo que o primeiro antibiótico que eu dei aquela bactéria foi resistente e eu tentei o segundo eu tentei terceiro, quando eu tô no terceiro no Brasil e no mundo não tem mais antibiótico e ele não melhora. Esse é o momento que eu falo de uma falência do tratamento…
Camila: e tem os efeitos colaterais né, as vezes não é que não melhora, piora!
Milena:: Piora! Na verdade quase sempre piora, quando não responde já ao primeiro e ao segundo … então a ortotanásia ela vem exatamente aí porque eu posso ter um profissional de saúde falar assim eu sou contra cuidado paliativo Milena:. Tá você vai pegar o seu pai de 78 anos com tudo isso que eu falei colocar na UTI, entubar, respirar por aparelhos deixar ad eterno? Ou a gente vai conversar a respeito e ver olha a ciência falhou e agora eu tô olhando um processo que é um processo ativo de morte mesmo né em que não se responde aquilo que a ciência sabe esse é uma coisa que assim eu como profissional da saúde eu tenho condição de conversar com uma família e partilhar isso e eu consigo fazer isso gente muitas vezes com próprio paciente e às vezes são pacientes assim que a gente fala assim não é super simples será que eles vão entender e são das pessoas que eu ouço as coisas mais que mais me marcaram na vida minha filha já sei de tudo mas você cuida da minha família você diz pra eles que é pra parar e que eu não quero voltar pra aquela UTI. Então é às vezes a família não quer contar pro paciente e o paciente não quer contar pra família.
Cris: eu tenho eu tinha essa percepção as vezes a pessoa não desistir por conta da pressão da família então eu lembro muito eu lembro da Mariinha, ela não tinha cabelo mais, ela tava muito pálida ela já era velhinha e ela tava tão frágil eu tinha a percepção de que se passasse um vento ela já desfazia mas o sobrinho tava ali todo o dia e ela falava não eu tenho uma responsabilidade com a essa família essa família tá lutando por mim se eu desistir eu sou o fraco e aí eu acho que tem essa dificuldade mesmo chegar pra família e falar assim meu dá um tempo pro cara…
Jussara: isso acontece. Às vezes o paciente, o doente ele resiste mais tempo por causa da família por causa dos filhos por causa da esposa por causa do… eu vi isso acontecer com um amigo meu que morreu muito cedo de câncer e ele resistiu um grande tempo esperando o irmão vir, a mulher aceitar e assim e eu sei porque ele disse pro médico e ele disse o médico se fosse só por mim eu fechava os olhos agora e ia porque eu sei que não tem mais nada a fazer mas por causa da esposa por causa do irmão ele ficou aguentou o máximo que ele pode mas como a doutora falou esse momento de que, o meu pai não pode mais responder mas ele ele decidiu assim fechando os olhos ele fechou os olhos e não abriu mais ele tava consciente mas a minha mãe pedia e ele não abriu mais os olhos e aí no momento em que aconteceu essa falência foi exatamente isso que os médicos fizeram eles vieram pra gente e nos deram a opção mas deixaram muito claro eles falaram a gente pode colocar o seu pai agora na UTI ele vai ficar entubado ele vai sofrer com esse processo e ele vai ficar lá e vai prolongar por um tempo não vai ser eterno mas… aí acontece eles o médico me disse pra mim pra minha mãe na UTI vocês só vão poder vê-lo naquele horário de visita então vocês virão uma vez por dia e verão durante uma hora não lembro quanto era o tempo mais vocês podem optar por isso ou vocês podem optar por deixá-lo aqui com todo o conforto a gente vai fazer o que for necessário e vocês vão estar do lado dele o tempo que quiser.
Cris: quanto tempo seu pai ficou em casa com cuidado da família?
Jussara: Então ele ficou no home care 3 ele ficou 3 semanas, quando a doença realmente agravou ficou três semanas que teve um problema no pulmão né dá pra infecção no pulmão e tudo e ele ficou três semanas no hospital aí melhorou eles conseguiram com antibiótico reverter todo processo assim reveter não né melhorou as condições e mandaram pra casa ele ficou no home care mais três semanas e aí ele piorou novamente é óbvio que quando a médica mandou é eu sabia o que estava acontecendo…
Cris: A minha mãe costuma falar que a melhora da Morte, minha mãe sempre falou isso dá uma melhorada pra depois morrer
Milena:: a ciências não explica mas ela existe. A gente tenta, estuda algumas coisas batem outras não…
Jussara: mas a minha mãe é eu percebi claramente que a minha mãe não aceitava isso quer dizer eu não poderia virar pra minha mãe e dizer olha mãe ele vai pra casa mas cê entendeu né que não é pra melhorar tá no fim eu não queria dizer isso a minha mãe ficou até o último minuto acreditando que ele ia melhorar e que ele ia voltar a andar e que ele ia ficar bom assim só realmente quando ele voltou pro hospital e aí ele ficou duas semanas e faleceu é que realmente na última semana que ela se deu conta né…
Ju: mas deixa eu te perguntar uma coisa porque é o limite que você colocou o limite é lá bem na pontinha, você colocou um caso de uma pessoa que realmente estava entre ir pra UTI e morrer em um dia e no caso por exemplo de uma pessoa que tem um câncer que é muito difícil de tratar já é idoso já tem uma série de marcadores como você fala que assim a chance dele passar por todo o tratamento e conseguir resistir assim ele vai ter a probabilidade maior é de ele gastar os últimos meses dias que ele tem de vida no hospital versus qualidade de vida que ele tem menos tempo que ele não quiser como que fala apostar – gambling, se ele não quiser fazer isso com a vida e ele falar eu prefiro os dias que eu tenho com certeza do que apostar todas as minhas fichas numa possibilidade isso é considerado ortotanásia, é recusa de tratamento?
Milena:: isso é bem interessante você perguntar porque vão ter profissionais que enfim talvez digam bastante o contrário do que eu vou dizer mas eu tô amparada no código de ética médica que é aquele que enfim rege minha profissão…
Cris: Você tá amparada no Mamilos pode falar!
Milena:: enfim no que eu consegui aprendi ao longo desse tempo com os pacientes e com as famílias que me proporcionaram isso e o paciente pode sim recusar Óbvio que eu tenho que saber se a diferença se ele tá deprimido e tem toda uma questão assim olha cara tá deprimidaço e aí ele fala assim não quero tratar Tá mas é uma unha encravada meu amigo vamos conversar melhor vamos chamar tua família…
Jussara: ainda tem chances de tratar e de curar.
Milena:: eu acho que pode isso agora você pega um paciente e olha já é a segunda terceira linha de quimioterapia é uma pessoa aqui um jovem que teve um ferimento por arma de fogo e tá na cadeira de rodas há alguns anos e é a vigésima infecção que ele tem e ele pode falar eu não aguento mais UTI eu não quero UTI. A longo dos… se eu tiver 80 anos e tiver uma neoplasia aqui não vai… a chance daquilo curar ou de que eu vá sofrer mais com tratamento eu quero ter essa autonomia para decidir então quando eu tô diante de um paciente assim né e de tomar decisões porque os tratamentos dão efeito colateral eles não são isentos eles custam caro né a gente tem que levar isso em consideração Ah o SUS é universal né mas você vai demorar pra entrar na fila né a gente tá aqui em São Paulo gente eu atendo hoje internado na enfermaria que eu trabalho tem 12 pacientes eu posso dizer pra vocês que 4 ou 5 querem voltar pro sertão de onde eles enfim nasceram e a gente trabalha com isso, vai ter uma jornada de cuidado paliativo em junho e uma das oficinas vai ser assim “de volta pra casa” eu vivo isso o dia inteiro assim assistente social ligando uma cidade que fica a 500 km de Salvador não tem morfina pra eu dar lá e ai a gente tenta fazer aqui vai em SP um monte no avião e com receita da gente né pro cara voltar pra casa. Então ele podia ter decidido isso antes isso aqui já não ta fazendo efeito Já tá te judiando né já já não faz mais sentido só que isso é pra medicina reconhecer a sua falibilidade e falar assim te uma outra quimioterapia mas assim aumenta a sobrevida em alguns por cento em 3 meses e não são de todos os pacientes. Então eu quero saber isso então com informação e comunicação adequada eu consigo falar. É lógico que não é toda doença eu acho que tem que tratar enfim uma insuficiência cardíaca é uma doença incurável que o paciente fica indo e voltando da UTI que tem que ter um limite porque surge o dia da família né então não é todo paciente que dá pra morrer em casa não dá. Olha o apartamento de vocês olha a casa de vocês passa uma cadeira de rodas? não passa! na minha não passa!
Jussara: as vezes você tem que desmontar a casa inteira foi que aconteceu minha mãe desmontou a casa inteira…
Cris: eu tenho percepção também que a família ela se organiza tanto pra receber aquela pessoa que precisa de cuidados especial que quando aquela pessoa falta fica todo mundo meio perdido e agora o que que a gente faz com todo esse tempo livre que existe agora porquê e não precisa mais cuidar daquele ente então acho que tem muito isso também as pessoas desaprendem… aprendem a viver com aquilo e depois e aí, se faltar você vai viver como?
Milena:: acho que em doenças crônicas e que a gente tem mais um tempo por exemplo tô falando de Alzheimer tô falando de Parkinson esclerose múltipla né quando se chega numa fase bastante avançada você tem isso você tem o stress do cuidador né Que costuma acometer esse que você tá me falando depois a pessoa fica sem o vazio porque aquilo era o trabalho aquilo era a vida eu vivia pra colocar dieta eu vivia pra virar alguém na cama trocar fralda etc. isso é uma situação bastante difícil. E aí assim quando eu falo dessa questão de trabalho com cuidado paliativo faço atendimento domiciliar eu acho que tem famílias e pacientes que isso é possível eu acho que tem famílias e pacientes que isso é impossível ou pelo paciente ou pela família, mesmo tendo alguns tem home care e tal eu acho que o caso mais emblemático que eu tive tá num livro que eu ajudei a a escrever…
Cris: qual livro?
Milena:: chama “câncer uma visão multiprofissional” tem uma foto lá que é do Seu Miguel tô falando isso porque a família autorizou a gente tem a foto dele que foi tirada uma semana antes de ele falecer ele já era um idoso muito frágil com várias outras doenças e aí enfim viram nódulos é linfonodos mediastinais enfim no meio entre o pulmão coração no meio do peito ele não tinha condição nem de fazer uma biópsia guiada por tomografia ele falou ele foi uma vez aí o marcapasso desregulou ele teve uma arritmia foi parar na UTI e assim foi bem difícil e ele falou eu não quero fazer isso aí o oncologista pediu Milena: me ajuda e eu tive a oportunidade de conhecer o seu Miguel e todos os doze filhos dele ele tinha esposa e todos os 12 filhos tinha uma cuidadora oficial que era uma das filhas a mas ele decidiu isso ele falou ‘olha enquanto eu puder eu venho no seu consultório e depois cê vai na minha casa?’ ele tinha um pouco mais de condição a gente conseguiu ter o home care que isso não é a realidade da maior parte dos brasileiros e aí gente uma semana antes dele falecer ele tem a foto e essa foto tá no livro que é uma cama hospitalar que facilitava o cuidado dele em casa ele deitado e ele estava fazendo cafuné gente no bisneto um molequinho que ajudou a dar comida pra ele porque fizeram um almoço de família com 12 filhos vocês imaginam como é que tava a casa…
Cris: que beleza!!
Milena:: Seu Miguel super religioso era da igreja enfim deve ter sido uma festa muito legal assim cheia de gente e enfim uma semana depois ele faleceu e eles tem essa foto e compartilharam conosco foi superbom ele morreu com dignidade, em casa perto de quem ele amavacom condição de não sofrer e a família tranquila.
Camila: aí a gente entra naquela questão da boa morte eu lembro agora o final do Poderoso Chefão que ele morre brincando com o neto dum ataque cardíaco que dizem que a morte de rei. Você falou que você assina de 8 a 10 atestados de óbito por semana em algum deles você pensa essa foi uma morte boa, foi uma morte ruim, você tem essa essa impressão ou não?
Milena:: Olha vou dizer pra você que eu tenho 10 anos de formada eu faço enfim cuidado paliativo há 7 anos, participo de alguns grupos e na minha formação sempre teve presente eu acho que a gente morre como a gente viveu. Óbvio que não dá pra generalizar mas o que eu consegui aprender ao longo desse tempo assim com os pacientes e com as famílias é que assim meu se você teve amigo na hora que você tiver morrendo eles vão estar lá se a tua sua família esteve perto eu tô falando de uma condição social, emocional porque isso é determinante pro paciente morrer bem eu posso ter muito remédio, eu sedo gente quando a coisa não tá boa e a sedação não antecipa nada ela deixa o paciente mais confortável até que enfim a falência de múltiplos órgãos aconteça e enfim a morte apareça geralmente uma dose bem leve pro paciente ficar mais confortável e aí você vê que ele não fica e aí você aumenta remédio e mexe aqui mexe lá em termos técnicos e nada e aí chega um filho que ele tava esperando e aí vem finalmente no hospice a gente consegue ter, vem cachorro a gente teve a visita de duas calopsitas no hospice sabe e assim ela decidiu que ela doou tudo antes de ir pra casa e as calopsitas ela queria deixar com uma vizinha enfim a vizinha levou as calopsitas pra visitá-la sabe a paciente. Assim eu realmente acho que a boa morte é decorrência de uma boa vida. Lógico que tem uma questão técnica prática e se eu tiver ortotanásia eu realmente acredito nisso se tiver o cuidado paliativo e aí acho que o dado é legal você perguntar isso porque… Na Holanda eles comparara né já era permitido eutanásia lá e quando tem o advento do cuidado paliativo e isso começa a se difundir na formação da… enfim dos profissionais na Holanda eles fizeram um artigo bastante interessante eles pegaram quase 4 anos de acompanhamento né pré e pós advento do paliativo e instituição do hospice na Holanda e o índice de pacientes que pediram a eutanásia reduziu gente e foi parar em 2% e antes era 38%
TODAS: Nooossa…
Milena:: tipo assim de pacientes que solicitavam eutanásia. Sabe é um marcador que você fala assim…
Cris: Ok somos necessários
Jussara: não dá pra ignorar de forma nenhuma.
Milena:: Não dá pra ignorar, você consegue ajudar e assim quem tem dor gente igual assim dor de cabeça, dor de dente, assim você quer tá com a cabeça… você quer trabalhar nesse dia? Você quer… não! porque tá doendo e essa dor que incomoda dor de câncer e outras não sei lá se tem uma falta de ar porque enfim tem pulmão tem uma fibrose importante você não quer viver você não tem prazer se eu consigo agir aí eu acho que a Boa Morte chega. Nós estamos comentando algumas coisas cuidado paliativo e acho que é interessante ter alguns exemplos né eu te falei alguns exemplos foram de pessoas desconhecidas mas a gente tem aqui no Brasil muitas pessoas conhecidas que enfim optaram por uma morte no seu domicílio saindo enfim da tecnologia optando por estar perto de casa, a gente tem a lei Mario Covas que foi enfim um ano antes dele iniciar o tratamento e falecer ele já tinha iniciado o tratamento mas faleceu no ano seguinte e que ele faleceu em casa.
Ju: O que eu é essa lei Mario Covas?
Milena:: A lei Mario Covas foi feita exatamente pra proteger né os profissionais que cuidavam enfim de pacientes que optavam por uma morte fora daquele ambiente hospitalar né e ela abriu portas pra gente pensar que é possível ter um tratamento digno e deu ao paciente o direito disso tudo, é uma lei estadual tem enfim alguns juristas que questionam e tal mas enfim naquele momento foi super importante né e assim um ano depois ele é privilegiado com essa lei e as pessoas que cuidaram dele também e a gente tem a Hebe Camargo e a hora que ela sai foi muito simbólico assim a hora que ela sai da porta do Einstein né maquiada e de salto alto e vai pra casa e depois a gente sabe que a Hebe morreu em casa né uns dias depois acho que uma semana ou menos a gente não sabe quem cuidou dela como é que foram os cuidados em domicílio mas foi um paciente que faleceu em casa.
Ju: é… uma pessoa que conseguiu escolher, colocar os seus termos pra morte né vai ser nos meus termos e vocês não vão me ver acabado arrasada não desceu do salto até o fim da vida né.
Milena:: na hora que a gente assiste alguma enfim entrevista tal ela sempre mostrava a casa dela a capela enfim eu lembro bastante disso eu falei puxa ela escolheu. É obvio que a questão financeira pode ter sido determinante mas a hora que a gente discute mais isso provavelmente mais pessoas vão pensar no exercício da sua autonomia e nos seus próprios desejos.
Ju: queria pra gente encerrar falar um pouco sobre quando não é você que vai decidir sobre a sua boa morte ou sobre os esforços que você está disposto a fazer, qual o preço que você está disposto a pagar pela vida né então assim as estatísticas, esses marcadores eles colocam vai a tua chance é de cem pra um vai ter que botar um caminhão de dinheiro você vai ter que sacrificar tudo o que você é toda sua dignidade muita dor pra ter um por cento de chance de cura tem gente que é apostador nato e aposta e vai lá e consegue OK temos isso. Quando é você que tá fazendo as escolhas, minha vó jogou all-in 3 vezes e foi pra congresso de medicina. Ela ganhou 3 vezes na quarta não deu né galera mas assim 4 vezes botou tudo o que ela tinha na mesa todos os médicos desenganado ela foi lá tratamentos tenebrosos, dignidade no chão saiu vencedora conseguiu o que ela queria, ela escolheu agora quando não é mais você que escolhe é outra pessoa que escolhe o que você vai passar pelo inominável em nome de uma vida que não se sabe se vai ser boa não qual é esse limite quando não é mais o paciente que decide como lidar com esse limite de que às vezes é o que a gente tava falando às vezes por apego demais porque eu não estou preparada pra deixar ir pelo buraco que ele vai me deixar talvez pela culpa demais porque eu não estive presente na vida naquele momento então agora eu não quero te deixar ir enfim por uma série de fatores e aí o que que o médico faz?
Camila: que aí também a Jussara falou de resistir né a gente resiste a morte ou não resiste a morte. quando se fala em resistência partimos do pressuposto de que de alguma forma a gente decide não morrer, que é o que você comenta. Quando eu não eu não vou morrer eu não vou morrer essa força de vontade deve de alguma forma impactar no resultado do tratamento né?
Ju: não certamente… certamente isso faz alguma diferença né entre paciente que tem muita vontade de viver e o paciente que já entregou pras cobras…
Cris: é o segredo? Se você acreditar vai lá e…
Ju: não!!
Jussara: eu acho que é meio ponto pacífico que a parte psicológica influencia na parte física, isso é óbvio mas da mesma forma que a doutora Milena: falou da vida que você teve vai fazer diferença na hora de morrer eu acho que isso é entra também na questão dos familiares e da …
Ju: do deixar morrer
Jussara: de como os familiares e das pessoas envolvidas vão lidar. São N variáveis de interesses pessoais e aí entra tudo isso que você falou entra culpa entra uma forte dificuldade de aceitar a morte entram são N coisas e realmente isso é muito difícil há famílias que tem um consenso como o exemplo que ela deu os 12 filhos todos ali preparados e tal, na minha família também vi isso e tem famílias que não e aí depende muito da situação depende de quem é o paciente então assim você pode imaginar N situações de…
Ju: Mas o médico se vê como árbitro do conflito né?
Jussara: em alguns casos eu acho que…
Milena:: eu acho que as equipes ficam… é por isso que está em equipe multiprofissional e não ser um profissional único cuidar a gente divide e eu costumo falar que a gente entra na família e a família entra na equipe assim porque acaba sendo é melhor pro paciente quando a gente trabalha desse jeito.
Cris: é eu acho que corre o risco de ter o cara que fala você é louca? Você quer parar de cuidar? A pessoa vai né a pessoa que não aceita mesmo igual eu acho que tem um paciente que não aceita mesmo.
Ju: é porque assim geralmente assim a esposa conhece o desejo do marido sabe que ele não ia querer aquela vida que ele não quer isso e tem um filho que não aceita são 3 filhos 2 aceitam e um não aceita. E aí? É votação? É democracia? É a esposa manda mais que o filho? Tem que ser no consenso? Como que…
Jussara: As vezes entra no legal né, como no caso da americana…
Milena:: exatamente
Jussara: vai pra justiça.
Milena:: tem uma questão, nos Estados Unidos isso é muito claro né? Assim meu amigo não tô satisfeito eu vou pra justiça e vamos ver como é que é.
Cris: aqui tem o filho da puta que quer que o cara morre que a gente sempre pensa que aquele que quer para é o cara que não quer mais cuidar é o frio é aquele cara que quer se desfazer daquilo né? E esse passional nosso atrapalha muito né? Por isso que a gente tem essas dificuldade de envelhecer e ter esse cuidado profissional.
Milena:: eu acho que tem… eu vou pegar a questão da religião e vou falar de coping que é mais ou menos como a gente enfrenta as coisas, esse enfrentamento a partir disso, que aí entram questões de culpa, religiosas então assim ah meu pai a gente vê várias vezes isso né? Ex-mulheres que voltam pra cuidar do marido pra ajudar enfim, vizinhos que não tem um parentesco e voltam pra cuidar ou assim meu pai me abandonou eu tinha três anos e agora você quer que eu cuide dele já tive que ouvir isso e concordo, talvez não tenha proximidade mesmo física né nunca teve ué desconheci então a gente participa da vida de várias famílias assim mas acho que tem uma questão que quando você me cutuca assim um pouco Ju
Falando né dessa coisa do árbitro é que tem uma parte que são decisões muito medicas né, clínicas esse paciente eu tenho certeza que eu esgotei minha questão terapêutica em relação a ele eu tô fazendo distanásia e aí isso dá ao médico condição de decidir não é adequado né? Agora pra que isso não seja só uma questão do profissional né eu tô te falando aqui em Cuidado paliativo a gente tá em equipe. Assim a minha psicóloga também tem que achar isso. A assistente social do meu grupo, ah assistente social não sabe nada de doença… ah sabe um monte e ela sabe aquela família pode aceitar ou não sabe, às vezes quem vai mediando melhor o conflito medeia né melhor o conflito é a minha assistente social sabe, é o padre que veio e falou assim “Milena: pode mandar hospice que eu já conversei com a família. Padre tô assinando a alta”. É mais ou menos assim porque a gente cada um entra com uma linguagem diferente, uma estratégia de comunicação mesmo e o saber que é específico de cada profissional e de cada pessoa também.
Camila: v o que combina mais com cada dinâmica familiar.
Milena:: cada dinâmica tal… então assim me parece que em questões muito clínicas eu sou muito tranquila em tomar decisão né, então assim veio um filho de Londres tem esse, enfim essa abordagem, enfim esse SE de medicina chega o filho de Londres ele pode estar em qualquer lugar enfim ele chega lá e fala assim “quero que faça tudo”. E aí toda vez que eu ouço isso eu falo assim” vamos sentar?” e aí ou em uma reunião familiar ou enfim uma conversa no beira-leito “o que é tudo pra você?” Porque assim tudo você vai entender. É toda tecnologia assim quero botar no avião e mandar pra Harvard pra ver se lá eu faço coisa melhor. E aí assim, não, “não quero que sofra”. Bom disso eu sei. “Eu não quero que sinta dor”, nisso eu posso te ajudar. “Eu quero que meu pai vá pra casa” Não sei, mas vamos tentar esses dias se ele melhorar pode ser que dê mas se não der ele pode ir pra um ambiente fora do hospital e aí eu tenho a questão do hospice que…
Ju: o que que é esse hospice que você fala?
Milena:: eu acho que é importante, porque enfim né, no Brasil a gente tem um baita preconceito né porque falou de hospice enfim é uma palavra de origem francesa e que a gente tenta traduzir um pouco mas era uma hospedaria, as hospedarias, nas Cruzadas aqueles que tinham alguns ferimentos ou enfim não tinham onde dormir ficavam nessas hospedarias e isso depois foi mudando e aí tem a questão religiosa de né freiras e madres que vão ajudar mas enfim a gente coloca isso no Brasil a gente tem o asilo.e aí um baita preconceito e eu vou dizer pra vocês eu também tinha. Uma coisa que eu costumo falar pros pacientes e pras famílias principalmente ‘Olha a gente tá acostumado a asilo que bate em velhinho que viu na televisão que tinham condições de higiene péssimas tal.’ Não é isso, é o lugar adequado pra cuidar em que você pode delegar o cuidado das fraldas, da comida, de virar na cama pra dar mais amor e eu realmente acredito nisso que tem famílias que é o melhor e talvez pra minha seja um dia sabe. Então eu faço questão de que o hospice seja o melhor possível. Lógico gente que eu tô falando de uma instituição publica tem alguns lugares privados e tal, mas todos nós que batalhamos em cuidados paliativos a gente vê assim eu quero que tenha muitos hospices no Brasil e no mundo porque talvez eu precise de um e se eu precisar eu quero que seja bom né porque eu tenho contato com aquilo que eu acho importante. Os hospitais hoje, nenhum abre a janela porque tudo tem ar condicionado, tem o risco de infecção hospitalar não pode ter um ventilador, não posso ter uma planta então se eu gosto de planta se eu gosto de flor, na maternidade eu levo flor quando o paciente tá lá, não pode entrar a orquídea dela né, então é… e aí no hospice eu tenho o risco de infecção hospitalar menor eu tenho condições que aproximam o paciente mais de casa com a família mais tranquila porque eu tenho profissionais pra fazer. Eu acho que é um bom, não é pra todo mundo né, eu acho que o melhor talvez seria que todo mundo tivesse a oportunidade de falecer em casa perto da família, mas nem sempre é possível e quando não é a gente tem que ter alternativa, que não é a UTI que a gente fica 15 minutos de manhã e 15 minutos a tarde. Eu vim pra ca e minha sogra tava em casa e ela falou assim “faleceu a minha vizinha era uma senhora idosa com câncer de pulmão e os médicos falaram pros filhos olha leva pra casa e eles colocaram todo mundo dormiu aquele dia na sala as filhas também com um monte de ventilador porque ela tinha falta de ar e tal e aí quando uma das filhas acorda na madrugada né ela já tava… ela morreu… do lado das filhas”. Óbvio ninguém quer que alguém que você ama morra mas numa condição dessa que seja perto e que você esteja lá sei lá ajudando, passando a mão no rosto e aliviando, então o toque de quem a gente ama, isso o que eu consegui aprender assim ao longo desse tempo é mais importante do que as minhas intervenções médicas, que as intervenções médicas da enfermagem, que tudo isso assim, então o acho que eu faço hoje é um pouco isso…
Ju: Lindo!
Ju: vamos pro farol acesso? Cris qual a sua dica da semana?
Cris: bom eu vou referenciar novamente Mar adentro porque eu acho que é um filme belíssimo é um filme muito humano continuando aí no tema, saindo aí um pouco do que eu costumo fazer mas é Javier Barden tá impecável eu acho que história é incrível e vale muito a pena ver.
Ju: Milena:?
Milena:: fiquei aqui pensando que Mar Adentro é algo que a gente sempre indica em cuidado paliativo assim e pensa nisso né? Mas como a gente pincelou uma questão um pouco do envelhecimento e das escolhas que a gente vai fazendo né acho que Elsa e Fred é um pouquinho mais antigo mas tem uma questão do envelhecimento que faz a gente pensar como é que eu vou ser daqui um tempo né? A questão das paixões, dos desejos assim. Eu acho que outro é o Amor também que faz a gente pensar em como é que vão ser as escolhas…
Jussara: O Amor o filme?
Ju: é… é porque eu acho que esse filme é mais sobre como a gente tá sozinho nesse momento e como era importante a gente ter conversado antes porque na hora você tá com a escolha… as escolhas mais difíceis da vida e você está completamente sozinha pra fazer todas elas né, eu senti uma solidão nesse filme tenebrosa.
Milena:: e uma solidão imensa…
Ju: Camila?
Camila: eu indico a série A Sete Palmos – Six feet under que é da HBO e são 5 Temporada e é o melhor final de série já escrito de todos os tempos.
Jussara: Eu concordo! Maravilhosa!
Cris: Camila e seu jabá por favor o seu blog!
Camila: Ah! eu indico meu blog morte sem tabu da Folha de SP dá pra acessar pela home da Folha.
Ju: estará linkado.
Jussara: eu vou indicar um filme também que é um filme novo da Júlia Moore ela concorreu a melhor atriz no Globo de Ouro acho não sei se foi indicada no Oscar mas no Globo de ouro foi. O filme em inglês chama Still Alice tradução literal seria ainda Alice eu não sei como vai chamar no Brasil se já tá pra ser lançado ou não mas é uma professora Universitária muito inteligente nova e se descobre com Alzheimer e o filme lida de uma forma muito bonita, muito pé no chão como enfrentar um momento desse quando você não espera você ainda é nova você não está velha e como você vai lidar com isso seus filhos sua família muito jóia o filme.
Ju: excelente!
Milena:: eu quero convidar, óbvio que é pra profissionais de saúde mas a gente tem recebido cada vez mais pessoas não ligadas à área de saúde mas enfim que tem alguns questionamentos em relação a cuidados paliativos, nós vamos uma jornada de cuidados paliativos dia 26 e 27 de junho no Instituto do câncer o ICESP, enfim dentre… tem algumas palestras e tem algumas oficinas que talvez não sejam aberta a todo o público mas pros profissional de saúde é. Nós vamos falar de comunicação, dessa questão que eu falei de volta pra casa…
Jussara: Mas as palestras são abertas?
Milena:: As palestras são abertas.
Jussara: Legal!
Cris: uau legal hein!
Milena:: enfim pra todos os profissionais.
Camila: Eu vou!
Jussara: também me interessei, também vou!
Ju: a minha dicas são os dois livros do Irvin Yalom…
Jussara: que eu adoro… deixa eu fazer o ÓÓÓ Irvin Yalom meu amor!
Ju: também adoro! Um deles o nome é bem bizarro parece livro bobinho que chama O Carrasco do Amor na verdade é incrível né livro de cabeceira pra você ler sempre…
Cris: parece Bianca né… Sabrina…
Ju: é parece…
Jussara: parece, mas não se deixe levar pelo título.
Ju: ele pega algumas dos aspectos que todos nós temos que passar algumas coisas universais algumas das negações universais que a gente tem, medo da morte da solidão da vulnerabilidade enfim ele vai pegando vários e ele usa casos típicos de pacientes típicos pra falar sobre como a gente lida com essas coisas então assim é essencial, lembrei dele porque tem sobre a morte saber como lidar com a morte. E o outro que ele escreveu Quando Nietzsche chorou que é espetacular, sensacional. É isso! Temos um programa? Temos um M?
Cris: Fica aqui a gostosa sensação desse tema né que dá um certo calafrio, mas estamos aqui justamente pra contar-lhes amiguinhos que também que morrer é um aprendizado.
Ju: Obrigada boa semana.
Cris: beijo
Todas: beijo