“Batman: O Cavaleiro das Trevas” mereceu a campanha que teve (e vice-versa)
Uma pergunta que eu e os leitores do Brainstorm #9 fizemos nos últimos meses finalmente foi respondida: “O filme vai ser tão bom quanto a campanha de marketing?”. A princípio parece uma pergunta estranha, mas natural depois de tudo o que o ARG de “Batman: O Cavaleiro das Trevas” entregou e prometeu.
A sensação comum era que se a publicidade era tão envolvente e mobilizadora, o produto final só poderia trazer muito mais do que isso. Uma expectativa gerada por mais de 1 ano teria que ser suprida, impossível esperar menos do que isso.
E ao sair do cinema, não há dúvidas de que o melhor filme de super-herói já feito (se é que podemos chamá-lo assim) mereceu a campanha que teve. Todo o seu universo e complexos personagens mereciam fazer parte da vida dos fãs e dos não tão fãs por mais do que duas horas e meia de exibição.
Como você já percebeu, esse post não é uma crítica do filme. Você pode ler ótimas no Omelete e no Cinema Em Cena, por exemplo. Esse texto é para destacar mais um aspecto positivo e que encerra, de maneira magistral, o ARG produzido pela 42 Entertainment.
Em diversos detalhes do filme de Chistopher Nolan você pode perceber a atuação da campanha. Nenhum aspecto do jogo de realidade alternativa foi aleatório, cada capítulo tem a sua relação com “Batman: O Cavaleiro das Trevas”, que você pode rever os devidos links, seções e acontecimentos em ordem cronológica no whysoserious.com.
É óbvio que você não precisa ter participado do ARG para gostar do filme. Ninguém precisa procurar pistas, resolver mistérios, atender ligações inesperadas e sair as ruas para ir ao cinema. Mas também é óbvio que quem o fez tem a experiência amplificada.
A indústria do entretenimento anda fazendo isso muito bem nos últimos tempos. Fala com dois públicos distintos. Com o espectador casual da mesma maneira que antes, mas oferecendo uma relação muito mais próxima para os fãs. São inúmeros exemplos recentes: a trilogia “Matrix”, “Lost”, “Cloverfield”, “Heroes”, até a “A Bruxa de Blair” se encaixa nisso.
Qualquer um pode acompanhar os episódios de “Lost” na TV, e assistir naquele formato que sempre existiu. Mas quem quiser mais, quem quiser participar e fazer parte da história tem ARG, livro, revista em quadrinhos, filmetes para celular, game para PC, Xbox 360 e PlayStation 3, etc.
O que um ARG como o do novo Batman nos ensina é que é preciso mais do que nunca mudar a velha segmentação de público que conhecemos. A decisão de com quem e como falar deve ser baseada em interesses. Não importa se um ARG não atinge a massa, não é pra isso que ele é feito e pensado.
Acredito que o esquema abaixo, feito pela 42 e que me permito copiar aqui, demonstra bem essa divisão de público. Como se trabalha com os diferentes níveis de interesse das pessoas em um ARG. Falamos também bastante sobre o tema no Braincast 14. Ouça aqui.
Casuais: Representam a maior parte da audiência, com um modesto nível de interação que acontece primariamente online. Eles seguem um guia que o ajudam a participar da experiência.
Ativos: Representam a audiência média de um ARG, com um nível significante de interação online e offline. Eles seguem a experiência a sua maneira, no ritmo que desejam.
Entusiastas: Representam o topo da audiência, com o mesmo nível de interação online e offline. São profundamente engajados com a experiência e geradores de conteúdo dentro de sua comunidade.
Qualquer um desses três níveis de público que acompanharam as ações do ARG, certamente terão uma experiência diferenciada no cinema. Pela minha cabeça foi comum o pensamento durante o filme: “Ah, então foi por isso…” ou “Falaram disso naquela ação…”
Quem nunca nem ouviu falar disso ou não teve saco para acompanhar, também se diverte, mas a campanha é uma lição de como falar com um público que espera mais, que precisa mais para dar a você alguns minutos de atenção tão fragmentada.
Quando bem feito os resultados são claros, diretos e lucrativos. Uma mania gerada, ingressos disputados, e que transformam o público em parte essencial da divulgação, os multiplicadores que tornam possível não depender, em nada, da mídia como a conhecemos.
E por fim, gostaria de dizer: não quero ver mais nenhum Coringa. O personagem definitivo já foi feito. Bate uma tristeza ao final do filme por saber que não veremos aquilo novamente. O discurso parece batido por causa de sua morte, mas a verdade é que o cara roubou a cena e entrou pra história.